Blog do Osmar Pires

Espaço de discussão sobre questões do (ou da falta do) desenvolvimento sustentável da sociedade brasileira e goiana, em particular. O foco é para abordagens embasadas no "triple bottom line" (economia, sociologia e ecologia), de maneira que se busque a multilateralidade dos aspectos envolvidos.

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Pós-Doc Dir. Humanos PPGIDH-UFG, D.Sc. C. Ambientais, M.Sc. Ecologia, B.Sc. Direito, Biologia e Agronomia. Escritor Academia de Letras de Goiânia. Autor de A gestão do espaço urbano e a função socioambiental da cidade. Londrina, PR: Sorian, 2023. 404p. O efeito do combate à corrupção sobre os direitos humanos... Goiânia: CegrafUFG, 2022. 576p. Família Pires... 3. ed. Goiânia: Kelps, 2022. 624p. Perícia Ambiental e Assistência Técnica. 2. ed. Goiânia: Kelps/PUC-GO, 2010. 440p. A verdadeira história do Vaca Brava... Goiânia: Kelps/UCG, 2008. 524p. Arborização Urbana e Qualidade de Vida. Goiânia: Kelps/UCG, 2007.312p. Introdução aos SGA's... Goiânia: Kelps/UCG, 2005. 244 p. Conversão de Multas Ambientais. Goiânia: Kelps, 2005, 150p. Uma cidade ecologicamente correta. Goiânia: AB, 1996. 224p. Organizador/coautor de Lawfare como ameaça aos direitos humanos. Goiânia: CegrafUFG, 2021. 552p. Lawfare, an elite weapon for democracy destruction. Goiânia: Egress@s, 430p. Lawfare em debate. Goiânia: Kelps, 2020. 480p. Perícia Ambiental Criminal. 3. ed. Campinas, SP: Millennium, 2014. 520p. Titular da pasta ambiental de Goiânia (93-96) e de Goiás (03-06); Perito Ambiental MP/GO (97-03).

Saturday, July 06, 2024

OPERAÇÃO PROPINA VERDE

UM CASO EMBLEMÁTICO DE INVESTIGAÇÃO CONTRA A CORRUPÇÃO QUE DESTRUIU DIREITOS HUMANOS E PRESERVOU AGENTES POLÍTICOS DE LIBIDINOSA REPUTAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM GOIÁS

Osmar Pires Martins Junior[1]

O MP-GO alardeou que a Operação Propina Verde apurou suposto rombo de 1 bilhão, após 1 ano e meio de investigação realizada por 10 promotores de justiça, 20 servidores da área de inteligência, 20 delegados de polícia e centenas de policiais civis e militares, que prendeu 10 servidores técnicos ambientais, mas nenhum agente político da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos de Goiás - SEMARH (detalhe: então dirigida pelo ilibado deputado federal Jovair Arantes). (In: O Popular. Propina liberava desmatamento. Goiânia, 14 dez. 2010. Cidades) 
A respeito, a referida operação do MP-GO está publicada na p. 87 do livro: BRASIL. Conselho Nacional de Procuradores-Gerais (CNPG). Investigações exitosas realizadas pelos Ministérios Públicos brasileiros. Natal: MP-RN, 2013. 420 p. Disponível em: <https://search.app/CL5wsz6bzmXKbdL88>.

Dentre os servidores presos na malfadada Operação Propina Verde, destacam-se os técnicos ambientais que o signatário conhece desde a década de 90 e com eles trabalhou quando exerceu a incumbência de presidente da Agência Ambiental de Goiás (2003 a 2006): José Rodrigues da Silveira, Paulo Roberto Linhares, Alejandro Alvarado Peccinini, Walquíria das Graças Caldeira e Silva, Antônio Borba Munin, Bernadete Gomes e Lauriano, Eustáquio Ferreira dos Santos e Greide Ribeiro Júnior.

Ao todo, 11 fiscais e técnicos da AGMA foram submetidos às acusações não comprovadas de improbidade administrativa (ato doloso e danoso ao erário com enriquecimento ilícito), tráfico de influência (obter vantagem ilícita), corrupção ativa e passiva (oferecer ou receber vantagem indevida), concussão (exigir vantagem em decorrência do cargo exercido) e peculato (má utilização de recursos públicos).

Os servidores alvo da operação foram vitimados por prisões cautelares, sem sequer saber do que eram acusados; exonerados dos seus cargos públicos; e privados da sua liberdade. 

Alguns, arrancados de suas casas na madrugada de 14/12/2010, quando ainda dormiam, como o engenheiro agrônomo José Rodrigues da Silveira. Outros técnicos ambientais da AGMA foram presos dentro da repartição pública, nos seus ambientes de trabalho, sob os holofotes da grande mídia escrita, falada e televisada. Algemados, jogados num camburão da polícia e trancafiados numa cela da cadeia pública.

Durante tenebrosos dias de tortura física e psicológica, foram mantidos incomunicáveis na tentativa de arrancar-lhes confissões em depoimentos colhidos sem advogados.

O caso Greide Ribeiro Júnior

Greide Ribeiro Júnior, casado com Celma Adriana de Assis, foi servidor público estatutário do Estado de Goiás na função Fiscal Ambiental da Agência Goiana do Meio Ambiente – AGMA que, extinta, foi incorporada à Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Goiás – SEMARH, hoje SEMAD, onde Greide exerceu o cargo de Superintendente de Fiscalização, tendo participado da criação de vários parques estaduais.

Greide Ribeiro Júnior integrou a equipe técnica que elaborou o levantamento dos recursos socioambientais de subsídio ao plano de manejo do Parque Estadual da Mata Atlântica em Goiás (PEMA), aprovado pela 42ª Sessão Plenária do Conselho Estadual do Meio Ambiente – CEMAm, em 20/04/2005 e criado pelo Decreto 6.442, de 12/04/2006, por meio da conversão de multa ambiental em prestação de serviços de preservação, recuperação e melhoria da qualidade do meio ambiente.

O Parque Estadual da Mata Atlântica (PEMA) foi implantado através do Programa de Apoio a Ações Ambientais (P3A), instituído pela AGMA, em 2003. Não houve despesa para o Erário Público. A multinacional Endesa, concessionaria da Usina Cachoeira Dourada S.A. (CDSA), que funcionou durante décadas, até 2003, sem licença ambiental, firmou Termo de Compromisso Ambiental (arts. 72 e 79-A da Lei 9.605/98) com a AGMA. Regularizou a atividade, converteu as multas lavradas pela AGMA na aquisição das terras de proprietários privados pelo preço de mercado, conforme laudo expedido pelo CREA-GO e com recursos privados, estruturou o PEMA, dando quitação ao passivo ambiental com a expedição da licença ambiental definitiva à CDSA pela AGMA.

As ações ajuizadas pelo MP-GO contra Greide Ribeiro Júnior estão associadas ao importante papel que desempenhou na implantação de uma unidade de conservação, localizada na região de terras mais caras da região central do país, sem onerar o erário, por meio da conversão de multas ambientais, preservando uma floresta ameaçada de extinção, com paisagem de rara beleza e elevada biodiversidade.
Entrevista concedida por Greide Ribeiro Júnior, em 13/03/2009, ao blog do Wagner Oliveira, divulgada no portal Educação Ambiental em Goiás, acessado em 17/01/2020

Greide Ribeiro Júnior foi preso preventivamente em 14/12/2010 na Operação Propina Verde, ao lado de outros 10 fiscais e técnicos da AGMA. Assim como os demais, Greide Ribeiro Junior, na data de execução da malfadada operação, em 14/12/2010, de forma desumana, foi exonerado da função que exercia na AGMA, sendo arrolado no polo passivo da ação de improbidade administrativa nº 385833-11 que tramita, desde então, na 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual de Goiás.

E mais, Greide Ribeiro Júnior foi acusado de peculato na ação penal, ajuizada em 21 de junho de 2012, proposta pelos promotores de Justiça Denis Augusto Bimbati, Juan Borges de Abreu e Elaine Barbosa da Silveira, do MP-GO, ainda em trâmite no Tribunal de Justiça de Goiás.

O lawfare do MP-GO contra Greide Ribeiro Junior contém todas as características do uso estratégico do direito pelos agentes estatais dos órgãos do sistema de justiça, sobretudo, por ser vítima de ações sem justa causa (falta de autoria e de materialidade) e de overcharging prosecution (imputações destituídas de elementos existentes, verificados ou que podem ser provados).

A característica mais perversa do lawfare contra Greide Ribeiro Júnior se evidencia no resultado morte. No curso da feroz persecução desencadeada por agentes estatais dotados de poder econômico, estrutural e midiático, Greide faleceu em 6/10/2016. A sua condição de saúde sucumbiu ao hálito féretro de caluniosa, difamatória e monstruosa persecução judicial.

Com a morte do réu, o art. 107, I, do Código Penal prevê a extinção do processo, mas, o MP-GO pediu a substituição processual pelo espólio ou sucessores. A viúva Celma Adriana de Assis responde às imputações draconianas e injustas desferidas pelo MP-GO contra o finado marido nas ações civis e penais, nas quais, os pedidos liminares contra a sua liberdade pessoal, quando vivo, e a penhora de bens familiares foram denegados, às expensas de onerosos gastos.

No mérito, as ações contra Greide Ribeiro Júnior, após a sua morte, seguem penduradas como espadas de Dâmocles sobre as cabeças dos seus familiares – esposa, filhos e netos! O insaciável anseio por justiça permanece vivo como chama ardente entre seus familiares, a exemplo da manifestação, nas redes sociais, de um dos filhos de Greide Junior, o Adv. Bruno Campos, verbis:
O Adv. Bruno Campos, filho de Greide Ribeiro Júnior (30/04/1952; 06/10/2016), felicitou o pai, em 30/04/2022. no seu aniversário de 70 anos, se vivo estivesse, manifestando que, em sua memória, a justiça será feita!

O caso Antonio Borba Munin

O fiscal ambiental Antônio Borba Munin foi preso por suspeita de corrupção, acusado de intermediar negociatas com fazendeiros do Nordeste Goiano para o desmatamento ilegal do cerrado. 

A prova juntada na Operação Propina Verde era baseada em escutas telefônicas dos números da Agência Ambiental que gravou "frequentes conversas entre o fiscal Antonio e uma fazendeiro do Nordeste de Goiás".

Na peça acusatória do MP-GO, os promotores e delegados sustentam que Antônio Borba Munin usava ‘‘sofisticado sistema de comunicação baseado em códigos’’.

Segundo os competentes acusadores, quando o fiscal pretendia entregar a autorização fraudulenta e receber a propina acertada, ele dizia: "prepara o bode’’. Para a elevada inteligência investigativa do MP-GO, ‘‘bode’’ era propina.

Para a elevada inteligência investigativa da força-tarefa da Operação Propina Verde, coordenada pelo MP-GO, "bode" era propina e, por isso, Antonio Borba Munin, fiscal da AGMA que atuava na região do Nordeste de Goiás, foi preso, exonerado e humilhado publicamente, quando o que pedia nas ligações que fazia para o pai, sertanejo nordestino, era para preparar a carne de bode, prato típico da culinária regional


No decorrer do processo judicial, quando o acusado pode se defender a duras penas e juntar provas da sua inocência, Antônio Borba Munin provou que, ipsis litteris:  

[...] o fazendeiro do nordeste goiano era simplesmente meu pai, um sertanejo do agreste goiano, de origem e raízes fincadas nas tradições regionais; quando tinha viagens de fiscalização, que realiza há décadas pela região, ligava para o meu pai e dizia "prepara o bode", pois a carne de bode é um prato tradicional na cozinha do povo do nordeste de Goiás. [...] (TJ-GO.  Depoimento de Antonio Borba Munin nos autos do Proc. 0385833-11.2012 - Operação Propina Verde. 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual).

Antonio Borba Munin provou com extratos bancários da sua conta-salário movimentação de valores que correspondiam ao vencimento modesto de servidor estadual. Não havia nada que velasse propina, alardeada pela acusação e pela grande mídia em todo o país.

Demonstrou que os atos por ele realizados estavam em conformidade com a legislação atinente ao licenciamento e controle das atividades sujeitas à fiscalização ambiental. A título de comprovação do alegado por Antonio Borba Munin, colaciona-se a notícia infra, na qual a reportagem acompanhou um das 5 equipes de fiscalização da AGMA, coordenadas pelo fiscal ambiental Greide Ribeiro Junior - gerente de Ações Integradas.

Os fiscais da AGMA percorreram 2.500 quilômetros do cerrado ou 500 por dia. No Nordeste Goiano, onde atua o fiscal Antonio Borba Munin, foram fechados 200 fornos; apreendidos os caminhões de carga de carvão nativo, bem como as cargas de madeira e lenha; e lavradas multas contra carvoeiros, donos de caminhões e das fazendas desmatadas ilegalmente (In: Diário da Manhã .Operação Carvão. Goiânia, 19 dez. 2004. Cidades).





A Operação Carvão foi coordenada pelo gerente de Ações Integradas da AGMA, GREIDE RIBEIRO JÚNIOR e a equipe de fiscalização do Nordeste goiano foi comandada pelo fiscal ambiental ANTONIO BORBA MUNIN. Os dois fiscais foram impiedosamente presos, exonerados dos seus cargos, acusados e humilhados pelos órgãos do sistema de justiça lavajatista em Goiás.

O caso Alejandro Alvarado Peccinini

Alejandro Alvarado Peccinini é doutor em Ciências Ambientais pelo Ciamb/UFG. Foi apresentado na Operação Propina Verde como cereja do bolo, pois era o que ocupava posição de GERENTE DE BIODIVERSIDADE da AGMA. Ele foi responsável pela implantação do Laboratório de Geoprocessamento da Agência Ambiental, promovendo a gestão ambiental em Goiás no Brasil e no Mundo, de identificação de áreas prioritárias de preservação do bioma cerrado.

A ferramenta desenvolvida por Alejandro contribuiu para formular os mecanismos de crédito de sustentabilidade, apresentados pelo Brasil na COP de Paris que aprovou o sucedâneo do Protocolo de Quioto no Controle das Mudanças Climáticas Globais. Na imagem abaixo, Alejandro aparece em segundo plano (In: Diário da Manhã. Olhos abertos: Goiás tem tecnologia de ponta para monitorar meio ambiente. Goiânia, 17 nov. 2004, p. 2).
O trabalho competente de Alejandro Alvarado Peccinini na Agência Ambiental levou o MP-GO a convidá-lo para implantar o Laboratório de Geoprocessamento no Parquet, pois, graças à persecução contra o presidente da Agência de "ilegalidade" na assinatura dos TACs, os acordos passaram a ser controlados e assinados pelos promotores, surgindo possibilidades de negociação entre eles e os infratores autuados pela Agência. 

Depois de cumprir sua missão, implantado o laboratório, uma determinada promotora de justiça ordenou que Alejando assinasse um laudo atestando a conformidade de uma reserva legal extra propriedade rural situada em região fronteiriça de Goiás com a Bahia.

Alejandro não assinou de imediato o documento imposto pela promotora de (in)justiça. Jogou as coordenadas da área pretendida no sistema georreferenciado e constatou que a reserva extra propriedade proposta não se localizava em Goiás, negando-se a assinar. A promotora disse que não lhe cabia decidir! Alejandro Alvarado Peccinini, então, pediu exoneração do cargo comissionado no MP-GO e voltou para o seu órgão de origem. 

Na Agência Ambiental - AGMA, o Dr. Alejandro Alvarado Peccinini foi preso na Operação Propina Verde, algemado, jogado num camburão da polícia, sob os holofotes da grande mídia televisiva, escrita e falada, exposto como troféu. Seu nome, imagem e honra foram jogados na lata do lixo.

A título de combater a corrupção, o Parquet patrocina denúncias que, ao final, não se comprovam. O Código Penal tipifica o delito da denunciação caluniosa no art. 340, verbis: "provocar a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime ou de contravenção que sabe não se ter verificado: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa".

As "investigações exitosas realizadas pelos Ministérios Públicos brasileiros”, divulgadas pelo Conselho Nacional de Procuradores-Gerais (CNPG), no livro acima citado, reproduzem o fenômeno de fragilização dos direitos humanos operado na Propina Verde pelo MP-GO?
A denunciação caluniosa do MP-GO na Operação Propina Verde logrou destruir a imagem, o nome, a reputação, a honra e até a vida de técnicos ambientais, a exemplo de Greide Ribeiro Júnior; o Dr. Alejandro Alvarado Peccinini foi ostentado como “joia da coroa” da operação!

O caso José Rodrigues da Silveira

O engenheiro agrônomo José Rodrigues da Silveira, outro técnico ambiental preso na Operação Propina Verde, atuou no Departamento de Parques e Jardins da COMURG com o engenheiro agrônomo Robinho, ambos formados pela UFG, saudoso militante histórico do PT, morto por uma bala perdida em Goiânia quando se reunia com os amigos, em pleno Setor Bueno, nos idos de 1994. 

Com a morte de Robinho, José Rodrigues assumiu a Chefia do Departamento e, depois, foi nomeado presidente da COMURG, com a saída do então presidente para concorrer ao cargo de deputado federal. Tratava-se de ninguém menos que Jovair Arantes (à época, do PSDB), que era vice-prefeito na coligação eleita, liderada pelo prefeito Darci Accorsi (PT).

Vamos lembrar: até hoje, todos os gestores que presidem a COMURG saem de lá, ou ricos ou eleitos para cargos no parlamento estadual ou federal. E como saiu José Rodrigues da Silveira, encerrada a gestão de Presidente da COMURG? Deu sequência à sua carreira de engenheiro agrônomo!

Em janeiro de 2003, eu o convidei para a Agência Ambiental de Goiás com a missão de implantar unidades estaduais de conservação e promover o reflorestamento do cerrado.


Em virtude do seu trabalho dedicado e produtivo, José Rodrigues da Silveira permaneceu por longos anos na Agência, até ser preso na Operação Propina Verde, em dez. 2010, quando dormia, de madrugada, em casa, ao lado da esposa Maria. 

O telefone celular do signatário tocou, às seis horas da manhã de um certo dia daquele mês e ano. No visor celular o registro da chamada "Maria, esposa do Zé Rodrigues". 

Na ligação, a líder camponesa Maria, esposa do Eng. Agr. José Rodrigues da Silveira, aflita, que descreveu o quadro inusitado de abuso, arbitrariedade e desumanidade, ipsis litteris

[...] o Zé acabou de ser preso; entraram aqui em casa, de madrugada, arrobaram a porta de entrada da casa, do nosso quarto, nos tiraram da cama, de pijama e camisola. Meteram a algema no Zé. Na cabeceira, R$ 30 reais para a compra da padaria do nosso café da manhã. 'Tem comprovação da origem deste dinheiro', perguntaram. Não. 'Então apreende, ponha no envelope. É prova da corrupção'. Levaram os documentos e o computador da sala do escritório do Zé. Eu não sei onde ele está. O que fazer? [...]

O caso Paulo Roberto Linhares e sua filha adolescente

O fiscal ambiental Paulo Roberto Linhares é formado em Geografia pelo IGQ/IESA -UFG. É um caso emblemático dos métodos da Operação Propina Verde, adotados na Operação Lava Jato, de destruição dos direitos humanos. 

Paulo Roberto Linhares também foi preso pelas mesmas razões infundadas que os demais. Ele ficou sem comunicar com sua filha, uma jovem de apenas 12 anos, que ele criava. A filha ficou sozinha. Não sabia do pai. Passou fome. Em desespero, começou a se prostituir para sobreviver. 

O pai, ao tomar conhecimento da situação da filha, entrou em desespero. Tentou o suicídio. Foi internado no Pronto Socorro Psiquiátrico Professor Wassily Chuck.

Paulo Roberto Linhares, até a última informação que se teve dele, permanecia no Wassily Chuck, preso à cama, com os braços imobilizados. Tal situação absurda e desumana tinha por intento impedir novas tentativas de suicídio.

O caso José Ferreira de Souza

O auditor fiscal José Ferreira de Souza foi peça-chave na solução do problema do desmatamento do cerrado para o fim ilegal de produção de carvão nativo, com o consequente contrabando desta mercadoria, de forma clandestina, burlando as barreiras fiscais, para abastecer as siderúrgicas mineiras.

O auditor fiscal José Ferreira de Souza integrou o grupo de trabalho instaurado pelo presidente da Agência Ambiental, no competente processo administrativo, para avaliação e estudos, elaboração do diagnóstico e apresentação do prognóstico sobre a política florestal do estado de Goiás.

A competente auditoria de terceira parte, contratada pela AGMA em parceria com os stakeholders da cadeia produtiva florestal, sob a coordenação do advogado Clarismino Junior, ex-presidente da AGMA, foi discutida em workshop com os agentes interessados por0 uma nova política florestal baseada na integração dos bancos de dados ambientais e tributários, por meio de parceria proposta entre a Secretaria da Fazenda e a Agência Ambiental com os setores produtivos e a comunidade.

Com os resultados do referido processo, à época dos fatos, o signatário solicitou audiência ao governador Marconi Perillo, expôs o problema e a solução apresentada. O governador autorizou a reformulação administrativa do órgão, mediante criação de unidade competente da Dívida Ativa e Recuperação do Ativo Ambiental.

Para ocupar a Gerência de Tecnologia e Cobrança, recém-criada, o governador aceitou a indicação do presidente da AGMA e nomeou o engenheiro agrônomo, advogado e auditor fiscal José Ferreira de Souza, colocado à disposição da AGMA, a pedido do governador, pelo secretário da Fazenda do Estado de Goiás (SEFAZ). 

Com larga experiência na área, o auditor fiscal José Ferreira de Souza exerceu por 10 anos a função de conselheiro no Conselho Administrativo Tributário - CAT, o auditor assumiu a Gerência de Tecnologia e Cobrança da AGMA. 

O suditor fiscal José Fetteira de Souza alcançou a recuperação do ativo ambiental, desenvolveu e implantou o sistema digitalizado do novo selo florestal. Os dados ambientais e tributários da Agência e da SEFAZ foram georreferenciados e integrados, gerando o Selo Florestal Digital (In: O Popular. Notificação da Agência Ambiental. Goiânia, 4 jan. 2005, capa).


O trabalho do auditor fiscal José Ferreira de Souza permitiu a articulação dos dados fazendários e florestais num só sistema de código de barras, contendo informações sobre a origem, o transporte e destino da carga, representou uma revolução no setor, pois, chegando o caminhão no Posto Fiscal, bastava o número da placa do veículo para visualizar todas as informações necessárias ao controle fiscalizatório.

O caminhão com carga ilegal – carvão nativo destinado a siderurgia – era rapidamente identificado, a multa era lavrada contra o infrator, a carga e o caminhão apreendidos. O problema do consumo de carvão nativo oriundo do cerrado goiano foi solucionado, mediante aplicação das ferramentas adequadas: o comando-e-controle viabilizou a integração fiscal ambiental e tributária e permitiu eliminar o comércio clandestino do carvão nativo (In: O Popular. Fiscais montam cerco a carvoarias. Goiânia, 16 dez. 2004, Capa).

A atuação do auditor fiscal José Ferreira de Souza, assim como dos demais técnicos da AGMA, atraiu a fúria persecutória do MP-GO. Diferentemente dos demais citados, que foram alvos da Operação Propina Verde desencadeada no âmbito da AGMA, em dez. de 2010, José Ferreira, como auditor fiscal da SEFAZ, já não estava lotado na Autarquia Ambiental, tendo retornado ao órgão de origem.

Entrementes, o MP-GO acusou o auditor fiscal de improbidade administrativa na "ação da auditoria nos TACs" pelo exercício do munus publico de Gerente de Tecnologia e Cobrança. Pelo fato atípico de "elaborar o Termo de Referência da Auditoria Externa nos TACs firmados pela AGMA", aprovado pela Diretoria-Executiva da Autarquia Ambiental, constante da Solicitação NR 1114, de 31/07/2004, de Autorização de Licitação para a Contratação da referida auditoria, com pareceres favoráveis da Procuradoria-Geral do Estado (PGE), Secretaria de Planejamento (SEPLAN) e Gabinete do Controle Interno (CGI), responsáveis pela legalidade da Administração Pública do Estado de Goiás.

Estranhamente, os órgãos lavajatistas do sistema de justiça de Goiás, com base em provas ilícitas e falsos testemunhos, impuseram injusta condenação contra o auditor fiscal José Ferreira de Souza em ação de improbidade administrativa, conforme se discorre no subtítulo "A questão da auditoria nos TACs", infra.

O caso do pedido de prisão do presidente da AGMA combinado com overcharging

O uso estratégico do direito pelos órgãos do sistema de justiça que são adeptos de métodos lavajatistas, vem sendo desenvolvido há três décadas, em Goiás, na sua tripla dimensão: a escolha da jurisdição (1ª dimensão); o manejo draconiano da lei e do aparato policial (2ª dimensão); e a externalidade da mídia opressiva (3ª dimensão) visando o resultado condenatório da vítima como espetáculo teatral penal.

Nesse sentido, em 15/12/2005, três promotores de justiça
 – Márcio Lopes Toledo, Fernando Braga Viggino e Carlos Alberto Fonseca – e três delegados de polícia – Edilson Divino de Brito, Juarez Carlos Arantes e Ellen Cristina V. G. Cardoso – pediram a prisão preventiva do presidente da Agência Goiana do Meio Ambiente – AGMA, pela sua “conduta ilícita de não responder aos pedidos de centenas de ofícios expedidos pelo MP-GO e protocolados na AGMA" versando, sobretudo, questões relacionadas aos TACs.

A representação foi protocolada na 1ª Vara Criminal da Comarca de Goiânia, mas o seu titular, Juiz de Direito Jesseir Coelho de Alcântara, em 19/12/2005, declinou da competência e remeteu o feito ao Des. Jamil Pereira de Macedo, presidente do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) que, no dia seguinte, decretou segredo de justiça ao pedido de prisão preventiva.

No TJ-GO, em 26/01/2006, o Procurador-Geral de Justiça Substituto, José Eduardo Veiga Braga, o MP-GO requereu a Representação para Decretação de Prisão Preventiva do presidente da AGMA (Representação nº 69-8/198 (200503563468), que, 
considerada absolutamente inadmissível, foi indeferida pelo Relator, o Des. Aluízio Ataídes de Sousa, em 27/03/2006.

O MP-GO de Cúpula, por intermédio do Procurador-Geral de Justiça Substituto, já citado, interpôs o recurso de Agravo Regimental submetido à decisão colegiada da 4ª Turma Julgadora da 2ª Câmara Criminal do TJ-GO que julgou, verbis: 

[...] O substrato fático do pedido não guarda relação de conteúdo com o fundamento invocado [...] (TJ-GO. Representação 69-8/198. 4ª T. da 2ª Câmara Criminal. Julg. 25 abr. 2006)

Assim, por unanimidade, os Desembargadores Benedito do Prado, Charife Oscar Abrão e José Lenar de Melo Bandeira seguiram o voto do Relator e, em 25/04/2006, decretaram o arquivamento do pedido de prisão do presidente da AGMA.

Inobstante, os agentes estatais lavajatistas que conspurcam o sistema de justiça de Goiás, tramaram prender em flagrante o presidente da AGMA, durante a solenidade pública, realizada em 22/12/2005, no auditório do Palácio Pedro Ludovico, sede do governo estadual, de comemoração dos 30 anos da AGMA, de lançamento do livro “Conversão de Multas Ambientais” e de homologação pública da Lei n° 15.498, de 21/12/2005 que cria a Dívida Ativa Ambiental na AGMA e regulamenta os TACs em Goiás.

Frustrados no seu intento de realizar a desmoralizante prisão em flagrante do presidente da AGMA na solenidade de 22/12/2005, os agentes estatais lavajatistas do sistema de justiça em Goiás não se fizeram de rogado.

No Dia do Natal de 2005, os denunciantes publicaram na grande mídia comercial o pedido de prisão do presidente da AGMA, configurando exemplo criminoso lamentável de violação às leis e aos direitos humanos (In: O Popular. Investigação. Pedida prisão de presidente da Agência Ambiental. Goiânia, 24 dez. 2005. Judiciário/Cidades, p. 8).


Além do pedido de prisão, o MP-GO instaurou um quadro de persecução penal e sancionatório constituído por 109 inquéritos, processos e ações judiciais eternizados, desencadeados diretamente pelo MP-GO ou por ele provocados, envolvendo 319 agentes de um sistema punitivo - Delegacias, Promotorias, Receita Federal, Tribunal de Contas da União, Tribunal de Contas do Estado (In: RODOVALHO, Camilo Bueno et al. Estudo de caso. Lawfare do MP-GO em ações de improbidade administrativa sem justa causa. Goiânia, ABJD-GO, 2025. 120 p.).


O volume assustador e absurdo de denúncias, relacionadas no quadro supra, caracteriza overcharging prosecution, por meio de acusações frívolas, visando sobrecarregar o acusado, levá-lo à exaustão física, mental, moral e financeira, além de promover sua desorientação para dificultar o direito de defesa e lograr o resultado condenatório. Tanto que 107 frivolous charges não foram recebidas ou foram arquivadas como improcedentes, ineptas, sem justa causa. Remanescem 2 ações de improbidade administrativa, referentes à "contratação autorizada da auditoria nos TACs" e à "conversão de multas em  bens e serviços entregues à AGMA". 

As ações sem justa causa e as operações teatrais são apenas peças de marketing, sem compromissos com resultados úteis à sociedade! 

É preciso perquirir: ações civis públicas sem justa causa lastreadas em operações como a Propina Verde alcançam os objetivos que anunciam? Se alcançam, porque os seus resultados, supostamente, positivos, não são apresentados? Se não alcançam, porque os seus resultados negativos são escondidos da população? (como aqueles que estou narrando aqui) (In: O GLOBO. Esquema de propinas para licenças ambientais leva 24 à prisão em Goiânia. Goiasnet, 14 dez. 2010; CANAL RURAL. Operação Propina Verde investiga suspeita de crime ambiental em Goiás. Redação, 15 dez. 2010)
O MP-GO praticou denunciação caluniosa com grande estardalhaço

Do exposto, não resta dúvidas: a forma de atuação do MP não condiz com o desiderato constitucional de "tutor da sociedade"! Aliás, a filha de 12 anos do Paulo Roberto Linhares careceria sem dúvida de tutores, já que o pai foi preso sem chance de defesa... 

A fragilização dos direitos humanos em consequência da atuação arbitrária de agentes estatais do sistema de justiça, como aqui discutidas, está à mercê de pesquisas sérias que apontem caminhos para o fortalecimento do Estado Democrático de Direito.

É absolutamente desumano que um órgão estatal possa desferir acusações com ampla publicidade, cautelarmente prender, exonerar da função, afastar o acusado do trabalho, instaurar processo que exige gastos de energia, de tempo e de dinheiro com advogado e custas, durante décadas a fio, submetendo o alvo da sanha persecutória a uma variação inusitada de prisão perpétua.

Basta uma consulta ao site do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO) para se constatar a morosidade reveladora da natureza perversa de tais ações maculadas por condutas, métodos e concepções alheias aos princípios basilares do Estado de Direito: 
Número 0385833-11.2012.8.09.0051. Área Cível. Dados do Processo. Polo Ativo | Autor: Ministério Público do Estado de Goiás. Polo Passivo | Réus: Agnaldo Lopes; Alaides de Carvalho Pinto; Antônio Borba Munin; Bernadete Gomes e Laureano; Eustaquio Ferreira dos Santos; Greide Ribeiro Junior (sucedido pela esposa Celma Adriana de Assis); Gentil Moreira Carnauba; José Rodrigues da Silveira; Kleuber de Oliveira Sousa; Paulo Roberto Linhares e Henrique Cesar Barros Santana. Disponível em: <https://projudi.tjgo.jus.br/BuscaProcesso>
Curiosamente, Alejandro Alvarado Peccinini não está arrolado na acusação ajuizada na 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual pelo MP-GO (v. supra). Por que ele foi excluído, se nas peças publicitárias do espetáculo penal montado pelo MP-GO ele era a estrela principal?

Seria porque Alejandro Alvarado Peccinini dispunha de documentos provando que ele "desobedeceu" a promotora de justiça do MP-GO que lhe ordenou assinar laudo de reserva legal extra propriedade em outro estado na divisa de Goiás com a Bahia?

Espada de Dâmocles

Inobstante as denúncias improcedentes contra dirigentes e técnicos ambientais da AGMA na Operação Propina Verde, o acusador mantém a persecução. Os acusados foram, na prática, condenados à pena máxima da persecução penal abusiva com mais de 15 anos de duração, até hoje. 

As acusações injustas, improcedentes, ineptas, vazias, frívolas permanecem ativas no site do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO). 
Técnicos ambientais da AGMA no Polo Passivo da Operação Propina Verde (TJ-GO. Proc. 385833-11. 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual)

Tal situação configura espada de Dâmocles, como uma alusão frequentemente usada para representar uma atuação daqueles todo-poderosos que, sabedores da inocência dos acusados, mas seguros do grande poder que usufruem, mantém sob controle o jurisdicionado, submetendo-o ao tacão do arbítrio de eterna persecução, visando instaurar um sentimento de "danação iminente".  

Os apontamentos registrados neste artigo foram enviados para a Professora Helena Esser dos Reis, pesquisadora do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Direitos Humanos (PPGIDH-UFG) e também para o Advogado Camilo Rodovalho, coordenador da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD-GO), com a seguinte manifestação, verbis:

[...] Histórias terríveis, Osmar. De fato, é preciso pensar o problema do Lawfare a fim de combater qualquer uma de suas múltiplas possibilidades de manifestação. [...] (Profª Drª Helena Esser dos Reis – PPGIDH/UFG, em 30 de jun. 2024)

Qual o objetivo da perseguição contra servidores e técnicos ambientais em Goiás?

Na obra intitulada “Goiânia usurpada: a práxis da propriedade aparente contra a grilagem urbana” (e-Book), publicada pela editora Kelps, de autoria do signatário, resta esclarecido que a feroz perseguição desferida pelo Ministério Público de Goiás - MP-GO contra os técnicos e servidores ambientais de Goiás teve o condão de desmoralizar os órgãos ambientais do poder executivo e levar à extinção a Agência Goiana do Meio Ambiente - AGMA, objetivo alcançado em 2010,
com a incorporação das suas funções à Secretaria Estadual do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos, atual Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Goiás (SEMAD).

A extinção da Agência Ambiental de Goiás foi parte do plano estratégico da monopolização, para os órgãos interessados do Parquet, do manejo dos acordos de conversão de multas. Este instrumento de política ambiental, previsto na Lei dos Crimes Ambientais - Lei 9. 605/98 e na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente - Lei 6.938/2009
, é competência dos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA (arts. 72 e 79-A da Lei 6.938/98). Os órgãos do sistema de justiça - polícia judiciária, tribunal de justiça e ministério público - não integram este sistema, sendo vedado ao delegado, promotor ou magistrado firmar TACs na esfera administrativa.

A Agência Ambiental de Goiás, ao lado dos órgãos ambientais dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, era o mais antigo do país - batizado na década de 1970 como SEMAGO, depois FEMAGO e, quando extinta, Agência Ambiental. 

Praticando ativismo judicial e ingerência administrativa, os representantes do MP-GO lograram no Tribunal de Justiça de Goiás a declaração de inconstitucionalidade da Lei n° 14.498, de 21 de dezembro de 2005 – aprovada por unanimidade pela Assembleia Legislativa do Estado de Goiás. E, mais ainda, os destemidos e corajosos agentes estatais persecutores do MP-GO desencadearam feroz persecução, não contra os agentes que poluem, desmatam e degradam a natureza, mas contra as pessoas do então presidente e dos técnicos do órgão do Meio Ambiente que promoveram a recuperação do ativo ambiental, por meio da aplicação da ferramenta de conversão de multas.

O calote ambiental em Goiás, desde 1987 até 2002, era de 99,97%. No triênio 2003-2006, a inadimplência caiu para 70%. A recuperação do ativo ambiental em Goiás, colocada em prática pela autarquia ambiental, foi interrompido devido à forte ingerência judicial em assuntos de competência administrativa da alçado do poder executivo.

Isso ficou claro com a decisão do Tribunal de Justiça de Goiás favorável ao pedido do MP-GO que declarou inconstitucional a Lei n° 14.498/2005 e, assim, impediu a cobrança administrativa, a inscrição em dívida ativa e a execução judicial das multas ambientais lavradas pelo próprio órgão do Estado de Goiás.

Nada há de inconstitucional numa lei que confere ao órgão competente do Estado de Goiás o instrumental previsto no Sistema Nacional do Meio Ambiente para fiscalizar o meio ambiente, lavrar as penalidades contra o poluidor das águas, do solo e do ar ou contra aquele que desmata ilegalmente.

A cobrança dos valores pecuniários das multas aplicadas e a recuperação deste ativo por meio da composição administrativa entre o órgão do poder executivo e o infrator da lei ambiental são instrumentos de política ambiental legalmente instituídas no ordenamento nacional.

Dessa maneira, a absurda declaração de inconstitucionalidade da Lei Estadual de Goiás n° 14.498/2005 configura gritante ingerência do sistema de justiça sobre o Pacto Federativo Ambiental (art. 225 da Constituição Federal), desvirtuando sagrado dispositivo, segundo o qual, todos têm direito ao meio ambiente sustentável, incumbindo ao poder público e à sociedade o dever de preservá-lo às atuais e futuras gerações.

Epítome de um fenômeno neocolonial

O ativismo judicial e a ingerência do sistema de justiça configuram em Goiás o uso estratégico do direito contra alvos previamente selecionados – o inimigo – para o alcance de finalidades políticas, geopolíticas ou econômicas alheias à noção de justiça.

Neste artigo, são trazidos à baila todos os elementos constitutivos desse fenômeno de dominação neocolonial – o lawfare – na sua complexa dimensão estratégica, permitindo compreender a seletividade persecutória na escolha do inimigo, os servidores e técnicos ambientais do órgão do meio ambiente do estado de Goiás, cuja epítome se apresenta em sequência:

i) O ajuizamento de inúmeras ações de improbidade administrativa, do pedido judicial de decretação de prisão cautelar do presidente da Agência Ambiental que, mesmo em segredo de justiça e denegado pelo Tribunal de Justiça, foi divulgado na grande mídia pelos autores do pedido (3 delegados e 3 promotores) e a declaração de inconstitucionalidade da Lei estadual nº 14.498/2005 que impediu a instituição da Dívida Ativa na Autarquia Ambiental de Goiás.

ii) A deflagração da ostensiva Operação Propina Verde, pelo MP-GO, “de combate à maior corrupção da história de Goiás” com a prisão cautelar de 10 técnicos e servidores da Agência Ambiental, em dezembro de 2010.

iii) Em corolário à desmoralização institucional causadas pelas denúncias de corrupção, prisões e publicidade negativa, a Agência Goiana do Meio Ambiente foi extinta, em 2010, e suas funções foram incorporadas à SEMAD, que, por ser da administração direta, não possui agilidade para a execução fiscalizatória.

As ações supra descritas foram conectadas para alcançar um objetivo estratégico. O “mar de lama da corrupção’’ desmoralizou a autarquia, impediu a instituição da Dívida Ativa Ambiental, impediu o seu fortalecimento institucional com procuradoria e auditoria ambiental, cobrança e ajuizamento dos débitos ambientais.

A persecução do Parquet fomentou a extinção de uma das mais antigas autarquias ambientais do país, criada na década de 1970, no contexto das Conferências de Desenvolvimento Sustentável da ONU.

Frise-se: denúncias de corrupção, persecução judicial e prisões ocorreram por ingerência do sistema de justiça. 
Exemplo solar disso: a declaração de inconstitucionalidade da Lei 14.498/2005, o enfraquecimento administrativo, institucional e moral de uma instituição do poder executivo ambiental. Tudo isso criou condições para promover a extinção da autarquia; permitiu o alcance de um objetivo estratégico adredemente planejado pelo Parquet. 

Qual seja, viabilizou o monopólio nas mãos dos representantes do MP-GO dos instrumentos de negociação e ajuste dos valores das multas lavradas pelos órgãos competentes do poder executivo de controle da qualidade do meio ambiente e do uso do solo, sobretudo estadual, mas também municipal de Goiânia, e dos demais municípios do estado, a favor do próprio MP, segundo políticas estabelecidas por promotores e procuradores de justiça.

Qual o custo dessa ingerência do sistema de justiça na vida do cidadão? 

O ativismo judicial causa prejuízos variados. As primeiras vítimas, mais visíveis e frágeis, são os invisibilizados servidores públicos presos na operação policial. São as pessoas dos técnicos ambientais da Agência Goiana do Meio Ambiente. São centenas deles, considerando suas famílias, que tiveram suas vidas abaladas, suas carreiras interrompidas. 

As segundas vítimas evidentes da ingerência são os órgãos ambientais, não só o que foi extinto - AGMA - em decorrência do uso estratégico do sistema de justiça – uma Autarquia importante na história do meio ambiente, com experiência acumulada no controle da qualidade do meio ambiente do bioma cerrado. 

As terceiras vítimas do uso estratégico do poder judiciário para fins alheios à justiça  são o erário e a coletividade, em decorrência da ingerência sobre as atribuições do poder executivo de promover a cobrança das multas ambientais aplicadas contra os infratores do meio ambiente, impedindo a recuperação de ativos públicos.

De maneira perversa, o sistema de justiça perseguiu e prendeu não os infratores, mas os servidores que lavraram os autos de infração contra poluidores e degradadores. Em corolário, agravando o quadro de inversão de valores, a autarquia ambiental foi extinta, tornando o Estado ainda mais inoperante.

A ingerência do sistema de justiça sobre a política pública de meio ambiente em Goiás resultou na manutenção da iniquidade de um status quo absurdo, baseado no calote ambiental praticado em terra goyazes! De cada 100 reais de multa, míseros 3 centavos são arrecadados. 
Isso ocorre por que a Dívida Ambiental em Goiás é cobrada pela Dívida Tributária da Secretaria Estadual da Fazenda - SEFAZ. Os autos de infração lavrados pela AGMA permanecem inativos nos escaninhos da SEFAZ. Passados 5 anos, perdem sua validade, viram papéis podres. O infratores permanecem livres para poluir, desmatar e degradar o meio ambiente, as águas e o cerrado. Com os beneplácitos do sistema de justiça!

Nesse ambiente de conspurcação, os promotores de justiça do MP-GO “fazem a festa”, onde bailam a ingerência, a intromissão, o desvio e o abuso de poder. 
A matéria de propaganda da promotora Marta Moriya é bastante elucidativa (in: O HOJE. Promotora é sinônimo de conciliação e cobrança em Senador Canedo, em 8 fev. 2024).
A promotora citada, ao lado de Juliano Araújo e Ricardo Rangel, foram os principais representantes do MP-GO que deflagram as ações estratégicas de monopolização dos TACs no estado de Goiás.

Na matéria supra, publicada por jornal de uma das cidades mais importantes do estado, Senador Canedo, que integra a Região Metropolitana de Goiânia, a promotora é apresentada como ‘‘sinônimo de conciliação’’, ou seja, sinônimo de TAC, que é um instrumento de ajuste administrativo de competência do poder executivo. Veja.

Quem lavra infração referente ao uso do solo e ao meio ambiente local é o órgão municipal, mas, segundo a matéria, nada escapa à ação onipresente da promotoria de justiça, emitindo alertas nas áreas de segurança pública, meio ambiente e uso do solo, firmando TACs e até punições que afetam o bolso. 

Diz a promotoria na matéria que, na verdade, tem “mais interesse no prejuízo ambiental causado por empreendimento clandestino que dificilmente a promotoria consegue resolver”.

Explicitamente, a solução proposta resulta em “ajuizar ações’’. Dessa maneira, o TAC como instrumento de conciliação administrativa não alcança o objetivo de evitar a judicialização e, ao contrário, contribui para entulhar o Poder Judiciário.

À guisa de conclusão, pode-se afirmar que a monopolização dos TACs pela promotoria de justiça em Goiás não pacifica a sociedade, intensifica o conflito entre as partes envolvidas, agrava os problemas ambientais, aumenta o rombo do erário e fragiliza ainda mais os direitos humanos, como visto alhures.

A identificação do problema e sua solução

O problema aqui abordado se relaciona ao desenvolvimento sustentável por meio de instrumentos de políticas públicas a serem adotadas nas esferas de competência da União, dos Estados e dos Municípios.

É preciso delimitar que se trata da esfera administrativa e não jurídica. Os conflitos a serem enfrentados por ferramentas que se enquadram sob duas concepções complementares e articuladas entre si: a concepção de comando-e-controle (C-E-C) e a concepção de sistemas de gestão ambiental (SGA).

O comando-e-controle concebe mecanismos de fiscalização, monitoramento, tributação, penalização, embargos, interdição, licenciamento, autorização e demais ferramentas de adequação das atividades socioeconômicas ao padrão legal estabelecido.

Os SGAs, por sua vez, têm no comando-e-controle o ponto de partida para o desenvolvimento baseado em estímulos e compensações auferidos pelos benefícios e serviços ambientais proporcionados pelas atividades sustentáveis. 

Na concepção de SGA, a urbanização da zona rural de uma região metropolitana converte as áreas legalmente protegidas de reserva legal, áreas de preservação permanente e remanescentes florestais nativos em unidades de conservação com monetização dos benefícios em prol da comunidade e a correspondente retribuição econômica dos agentes produtores do espaço metropolitano.

A Agência Ambiental desenvolveu as ferramentas relacionadas nas concepções de comando-e-controle e de gestão ambiental sustentável na tentativa de solucionar os problemas do desenvolvimento em Goiás (In: Diário da Manhã. Atlas sobre o Cerrado - estudos discute novas possibilidades de desenvolvimento sustentável na região. Goiânia, 28 abr. 2005, Cidades, p. 2a).


Aplicações das concepções C-E-C e SGA

Um exemplo digno de nota de aplicação do comando-e-controle foi o combate ao mercado clandestino, então praticado à luz do dia, do carvão nativo do cerrado, destinado a abastecer as siderúrgicas mineiras. 

A Lei Florestal do Estado de Goiás estabelece destinação socioeconômica – madeira, carvão, celulose, movelaria, poste, marcenaria, indústria civil etc. – ao produto florestal oriundo do desmatamento legalmente autorizado pela Agência Ambiental.

Mas a Lei Florestal proíbe que o produto extraído da floresta nativa seja destinado ao grande e médio consumidor. 

Assim, as siderúrgicas estavam obrigadas a produzir 100% do carvão consumido nos fornos siderúrgicos a partir do início do ano de 2003.

O problema do carvão nativo do cerrado

Toda a cadeia produtiva da madeira fica obrigada a promover o reflorestamento florestal de árvores energéticas com a finalidade de manejo florestal, corte, carvoaria, transporte e consumo. A mercadoria transportada, como carvão, madeira e outros produtos derivados do desmatamento ou corte florestal teriam que comprovar a origem e o destino do produto.

Dessa maneira, a AGMA interditou todas as carvoarias no território goiano e determinou o consumo de produtos florestais a partir do reflorestamento e corte de floresta plantada (Portaria n° 100, de 29/12/2004) (In: Diário da Manhã. Cerrado precisa respirar. Goiânia, 28 jan. 2005, Cidades). 

A Lei Florestal de Goiás estabeleceu um prazo de 10 anos para o setor econômico promover a adaptação, com a implantação de um sistema florestal próprio capaz de abastecer em 1/10 da sua própria demanda anual. 

Dessa maneira, no ano de 2003, não haveria, em Goiás, nenhum estéril ou metro cúbico linear de carvão vegetal nativo, circulando pelas rodovias para abastecer o médio e grande mercado, seja ele interno ou externo (MG).

Se o MP-GO, fiscal da lei, cumprisse sua obrigação, exigindo obediência à Lei Florestal, não haveria carga de carvão nativo do cerrado sendo transportada em carretas pelas estradas goianas, em especial, na região do nordeste goiano em direção à Unaí-MG, que é o grande entroncamento rodoviário de abastecimento do polo siderúrgico mineiro.

Quando o signatário assumiu a presidência da Agência Ambiental, em janeiro de 2003, a Lei Florestal de Goiás estava sendo violentada às escâncaras, sob o olhar complacente de todas as autoridades do poder público – Judicial Legislativo e Executivo, bem como de todos os cidadãos e suas entidades, impotentes diante da agressão, bem como da imprensa pequena, média e grande, muda, cega e surda diante de fato tão grave.

Na primeira reunião da Diretoria-Executiva da Autarquia Ambiental de Goiás, o missivista apresentou a proposta de aplicação dos mecanismos de comando-e-controle e de gestão ambiental para a solução do problema do carvão nativo do cerrado. Para isso, era preciso diagnosticar a realidade então existente. 

O fazendeiro, dono de propriedade com cobertura vegetal nativa, interessado em desmatar para a produção agropecuária, pedia à Agência Ambiental a autorização do desmate.  O órgão ambiental procedia a fiscalização para verificar o cumprimento da lei ambiental – reserva legal, APP, cadastro rural, geoprocessamento da propriedade, topografia, tipologia da vegetação, delimitação da área de desmate e estimativa da quantidade de produto florestal gerado, em estéreis ou em metros cúbicos lineares, estabelecendo a destinação socioeconômica de acordo a Lei Florestal de Goiás.

Feito isso, estando conforme a lei, a Agência Ambiental expedia a autorização de desmatamento, com as coordenadas delimitando o local, a propriedade, o proprietário e o município. 
Toda autorização de desmatamento era acompanhada do selo florestal correspondente à quantidade em estéreis ou metros cúbicos lineares de carvão ou de outro produto florestal gerado no caso concreto. 

O selo, como o próprio nome indica, acompanha a autorização e era colado na nota fiscal de transporte da mercadoria – o carvão – emitido pela Agenfa do Município onde se localiza a propriedade rural onde foi realizado o desmatamento.

Como se pode facilmente suspeitar, esse sistema de controle possui fragilidade evidente: o selo emitido para uma determinada autorização de desmatamento era repetidamente utilizado para o transporte de inúmeras cargas de transporte da mercadoria.

Para constatar o tamanho do estrago, o presidente da autarquia aprovou, na referida reunião da Diretoria-Executiva da Agência Ambiental, em janeiro de 2003, a realização de auditoria nas contas florestais dos médios e grandes consumidores de produto florestal cadastrados na Agência.

A auditoria foi feita e o resultado não poderia ser outro: 100% das Siderúrgicas Mineiras cadastradas consumiam produto florestal de origem nativa. Restou provado o contrabando do carvão nativo de Goiás para as siderúrgicas mineiras. 
Os caminhões carregados de carga clandestina formavam filas nas rodovias do nordeste goiano rumo a Minas Gerais. Os postos de fiscalização tributária nas fronteiras GO – MG eram incapazes de constatar a fraude e impedir a evasão fiscal.

O Parque Estadual do Pantanal Goiano com 60 mil hectares

A AGMA desenvolveu o mecanismo de gestão florestal sustentável, baseado na auditoria e diagnóstico da política florestal do estado de Goiás. A análise dos dados de consumo dos produtos florestais pelos médios e grandes consumidores demonstrou que as siderúrgicas mineiras detinham um passivo florestal de consumo do carvão nativo equivalente à área de 60 mil hectares do bioma cerrado.

Evidenciado o passivo ambiental do consumidor de produto florestal para com o cerrado goiano, a Agência Ambiental – AGMA desenvolveu o mecanismo de negociação e ajuste de conduta junto ao devedor desse passivo, representado pelo Sindicato do Ferro do Estado de Minas Gerais – SINDIFERRO/MG.
 
A AGMA negociou e firmou com o SINDIFERRO/MG um TAC de recuperação do passivo a ser convertido na preservação de uma área prioritária para preservação da biodiversidade, equivalente ao passivo florestal das siderúrgicas mineiras, para implantação do Parque do Pantanal Goiano, no Vão do Paranã em Goiás, conforme levantamento do Projeto de Áreas Prioritárias para a Preservação do Bioma Cerrado/Convênio Banco Mundial (In: O Popular. Indicadas áreas para preservação. Goiânia, 14 nov. 2004. Cidades, p.4)
A contribuição do auditor fiscal José Ferreira de Souza, dos fiscais ambientais acima nominados, dos servidores e técnicos da Agência Ambiental, permitiu desenvolver e aplicar ferramentas de comando-e-controle e de gestão florestal, 

Inclusive, a AGMA buscou parceria com o MP-GO para a consolidação de resultados permanentes (In: O Popular. Cerrado - Reunião debate ações para conter desmatamento. Goiânia, 5 jan. 2005, Cidades, p. 3).
Conquistas interrompidas pela ingerência de órgãos do sistema de justiça

O desempenho competente e os resultados positivos produzidos pelos técnicos e fiscais ambientais acima nominados - Greide Ribeiro Júnior, Antonio Borba Munin, José Rodrigues da Silveira, Alejandro Alvarado Peccinini, José Ferreira de Souza - como integrantes da equipe funcional da AGMA, permitiram implementar ações na busca da solução dos problemas ambientais, com destaque para o carvão nativo (In: O Popular. Carvoeiro para de circular para fugir da fiscalização. Goiânia, 20 jan. 2005. Cidades, p. 5), bem como na solução de outros problemas ambientais em Goiás.

No entanto, tais ações foram interrompidas, em grande parte, retrocedidas ou anuladas, em decorrência da atuação desleal do MP-GO que, em parceria com a DERCCAP, fomentou a ingerência do sistema de justiça de Goiás em assuntos administrativos da alçada do poder executivo estadual.

O MP-GO ajuizou ação civil pública contra as Siderúrgicas Mineiras, desconhecendo o TAC firmado pela Agência Ambiental com o SINDIFERRO-MG, objetivando excluí-la, avocando para si o controle do manejo do TAC.

De maneira antiética e desleal, a exclusão da Autarquia Ambiental serviu ao propósito de se apropriar e administrar os dados da auditoria, relativos ao consumo de produtos florestais em Goiás (In: O Popular. Protocolada ação contra siderúrgicas. Goiânia, 28 out. 2004, Cidades, p. 7).
A intromissão do Parquet em assunto da competência do órgão ambiental do poder executivo do estado de Goiás resultou no fracasso da recuperação do ativo florestal, pois o Parque do Pantanal Goiano figurou apenas nas matérias de autopromoção dos representantes do Parquet, como se mostra na matéria infra, na qual o trabalho desenvolvido pela Agência Goiana do Meio Ambiente é apropriado como "conquista inédita do MP" (In: Dário da Manhã. Conquista inédita do MP. Goiânia, 5 jun. 2009, capa).
Na realidade, o anunciado parque, com área de 6 mil hectares, representa apenas 10% da área de 60 mil hectares que corresponde ao passivo florestal levantado pela AGMA na auditoria das contas florestais das siderúrgicas mineiras que consumiram de forma ilegal produtos florestais do cerrado goiano. 

A compensação do passivo florestal pelo consumo de carvão de origem nativa do cerrado pelas siderúrgicas mineiras resultaria numa área de 60 mil hectares. O Parquet anunciou, como "conquista inédita", um parque de 6 mil hectares ou seja 10%. Cadê os outros 90%? 

Como se constata na matéria supra, mais uma vez, a exemplo da pretensa recuperação de valores estratosféricos anunciados pelo MP-GO na Operação Propina Verde, a dimensão estratégica da externalidade, ou seja, dos meios de comunicação, por parte do MP-GO, configura elemento essencial às condutas antijurídicas do lawfare.

O suprassumo da perversidade persecutória

Aborda-se aqui outra dimensão do uso estratégico do sistema de justiça praticado em Goiás, qual seja, o manejo do armamento legal de extrema letalidade, utilizado pelo acusador para alvejar o alvo selecionado.

Nessa dimensão do lawfare, o agente estatal do sistema de justiça utiliza as táticas e as técnicas do overcharging prosecution ou excesso de acusação, horizontal e vertical. São instaurados muitos processos administrativos e judiciais contra os mesmos acusados, nas esferas cíveis, administrativas e criminais e, em cada processo, são desferidas inúmeras imputações com as mais diversas tipologias.

E tudo isso, com muita publicidade negativa nos meios de comunicação social. A estratégia da mídia opressiva visa agravar a situação do acusado, dificultar, imobilizar e asfixiar a capacidade de defesa para o alcance condenatório. 

As operações policiais como Propina Verde, Calvário, Green Field e Lava Jato fazem uso estratégico das leis, manipuladas por agentes do sistema de justiça, de forma de ostensiva, em explícita violação ao contraditório, ampla defesa, paridade de armas, vedação ao bis in idem e meios inerentes ao devido processo legal.

Os técnicos ambientais mencionados foram alvejados por intenso tiroteio acusatório, desferido por armas letais manejadas pelos promotores Juliano Araújo, Ricardo Rangel e Marta Moriya, sendo que o primeiro se constitui, há décadas, no agente estatal ativo da persecução.

Segundo os agentes estatais persecutores, os acusados praticaram “crimes” como  elaboração de "termo de referência para contratação da auditoria nos TACs", de "formação de quadrilha para entabular a conversão de multas em bens e serviços direcionadas à AGMA", "dispensar a licitação entre infratores para realizar tal conversão", dentre outras atipicidades!

As acusações foram ostensivamente veiculadas na mídia. O clima de “ilegalidade e improbidade” na Autarquia Ambiental levou o governador do estado de Goiás a acionar o Procurador-Geral do Estado para discutir o problema com o presidente da Agência Ambiental.

A solução encontrada pelo Estado foi licitar a contratação de um serviço especializado de auditoria de terceira parte para auditar todos os processos administrativos ambientais contendo ajustes de conduta firmados pela autarquia do meio ambiente com os infratores ambientais (In: Conversão de multas ambientais em prestação de serviços de preservação, recuperação e melhoria da qualidade ambiental: o exemplo da aplicação dos TACs em Goiás. Goiânia: Kelps, 2005. 150 p. ISBN 85-7692-076-X).



A questão da Auditoria nos TACs

O Auditor Fiscal José Ferreira de Souza exerceu a função de Gerente de Recuperação do Ativo Ambiental da Agência Goiana do Meio Ambiente. Naturalmente, incumbiu-lhe formular a Solicitação NR 1114, de 31/07/2004, aprovada pela Diretoria-Executiva da Autarquia Ambiental. 

O termo de referência de contratação de auditoria externa nos TACs contem a delimitação do objeto, objetivo, justificativa, metodologia, prazo e orçamento do serviço de auditoria, dentre outros aspectos exigidos pela Lei de Licitação. 

No devido processo administrativo nº 2566/949-DGELP, o presidente da AGMA requereu autorização para licitação da contratação da auditoria, no qual, a Gerência Jurídica da Autarquia Ambiental, no Despacho 825, de 21/10/2004, manifestou pela inexigibilidade de licitação para a contratação de serviço técnico profissional especializado (arts. 13 e 25 da Lei de Licitação e Contrato Público - LCP n° 8.666/93)

O processo seguiu para a Procuradoria-Geral do Estado (PGE), que emitiu parecer assinado por procuradora jurídica e o respectivo Despacho GAB 010734/2004 da lavra do Procurador-Geral favoráveis à contratação de empresa de consultoria especializada em direito tributário e administrativo, no valor de R$ 52 mil.

Dessa forma, no regular processo de licitação, pelo rito autorizado da inexigibilidade, foi contratada a empresa Tributo Advocacia Empresarial, representada pela advogada Maria Aparecida de Castro Ferreira Morgado, auditora fiscal e contadora, especialista em Direito Tributário, Direito do Trabalho e Políticas Públicas e com experiência no Conselho Administrativo Tributário da SEFAZ.

A auditoria foi realizada, o relatório publicado no Diário Oficial do Estado e o resultado apresentado e discutido em sessões públicas realizadas no auditório da Agência Ambiental e na Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás. 
O serviço contratado foi entregue no prazo estipulado e pago no valor autorizado no competente processo administrativo, resultando em ganhos de eficiência e melhoria do instrumento de recuperação do crédito ambiental em Goiás.

O MP-GO instaurou inquérito civil público nas áreas civil e criminal, com base em documentação ilícita e em falso depoimento apresentados pelo ex-diretor da Administração e Finanças Eri Ristov e pelo ex-gerente de Licitação Luiz Carlos Tosoni Sant'Anna, ambos presos em flagrante ato de corrupção na AGMA, conforme matéria infra, constante dos autos do Recurso Especial REsp nº 1431610 GO, no STJ, às Fls.544.

 
 A Delegacia de Polícia desconsiderou as declarações e os documentos verdadeiros apresentados pela AGMA, considerou apenas o documento ilícito e o falso depoimento dos ex presidiários acima mencionados, promovendo, dessa maneira, o indiciamento penal e cível das pessoas do Presidente e do Gerente de Tecnologia e Cobrança da Autarquia, bem como da Auditora, a advogada responsável pela empresa especializada que prestou a auditoria. 

O Poder Judiciário recebeu as ações penais e cíveis, produzindo sentenças conflitantes em demandas que tratam dos mesmos fatos e pessoas. No criminal, os acusados foram absolvidos no TJ-GO e no STJ. Na ação civil pública, ao contrário, o MP-GO logrou a condenação por improbidade administrativa baseada no libelo de “contratação de serviços sem licitação”.

Inobstante a ausência de qualquer resquício de prejuízo ao erário e nenhuma sombra de enriquecimento ilícito por parte dos acusados, estes foram condenados às penas draconianas da antiga Lei de Improbidade Administrativa, inclusive a reparação de inexistente prejuízo aos cofres públicos correspondente ao contrato assinado, após autorização dos órgãos de controle interno do Estado de Goiás, no valor de R$ 52 mil, mais multa cível.

A ação de improbidade pela "entabulação dos TACs"

O interesse condenatório do MP-GO na ação de improbidade administrativa da auditoria dos TACs se relaciona ao mesmo interesse em outra, a ação de improbidade referente aos TACs, na qual o MP-GO logrou, no TJ-GO, a condenação, à revelia, sem o devido processo legal do contraditório e ampla defesa, do ex-presidente da AGMA.

O TJ-GO impôs arbitrariamente ao réu indefeso a perda dos direitos políticos, proibição de contratar ou receber recursos públicos por 5 anos, ressarcimento ao erário de R$ 5,75 milhões, além de multas astronômicas, pelo crime de entabular a conversão de multas com infratores ambientais, sem licitação, em bens e serviços entregues à AGMA, verbis:

EMENTA. DUPLA APELAÇÃO CIVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. [...] Entabulação de Termo de Ajustamento de Conduta [TACs] pela extinta AGMA com autuados. Possibilidade. Substituição das multas por bens destinados à própria Autarquia. [...]. Lesão ao Erário Público. Perda patrimonial. Ato atentatório aos princípios da Administração Pública. Sanções aplicáveis. Ressarcimento ao Erário. Importe limitado de ofício. Princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. (TJ-GO. AC nº 54615-90.2005.8.09.001. Relator Des. Luiz Eduardo de Sousa. Data Publ. 22 mar. 2017) (grifos nossos)

A nova Lei de Improbidade Administrativa - LIA nº 8.429/92, com as alterações introduzidas pela Lei 14.230/21, veda a condenação de reparação ou ressarcimento em ações de improbidade administrativa sem a comprovação do dolo (vontade consciente de praticar o ilícito), causando prejuízo ao poder público (dano ao erário) com o consequente enriquecimento ilícito do agente ou preposto. 
O MP-GO, nas exordiais das respectivas ACPs, não aponta qualquer sombra de dúvida na conduta do acusado, dada a completa ausência de elementos que apontem para a prática desonesta de propina, desvio de recurso público, superfaturamento ou enriquecimento ilícito!

Nos embargos à execução de ambas as ações de improbidade citadas, o ex-Presidente da Autarquia, transcorridas décadas de persecução, é defendido Pro Bono pelo escritório de advocacia do ex-procurador e ex-senador Demóstenes Torres que advoga a nulidade absoluta das mencionadas ações, pelas razões acima expostas.
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[1] Pesquisador pós doutor associado ao Núcleo de Direitos Humanos da UFG; doutor em Ciências Ambientais; mestre em Ecologia; bacharel em Biologia, Agronomia e Direito, todos pela UFG, exceto o último, pela UNIP; diretor Científico da Egress@s UFG, membro titular da cadeira 29 da Academia de Letras de Goiânia (AGnL) e da cadeira 69 do Instituto Cultural e Educacional Bernardo Elis para os Povos do Cerrado (ICEBE).