OPERAÇÃO PROPINA VERDE
UM CASO EMBLEMÁTICO DE INVESTIGAÇÃO CONTRA A CORRUPÇÃO QUE DESTRUIU DIREITOS HUMANOS E PRESERVOU AGENTES POLÍTICOS DE LIBIDINOSA REPUTAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM GOIÁS
Osmar Pires Martins Junior[1]
O MP-GO alardeou que a Operação Propina Verde apurou suposto rombo de 1 bilhão, após 1 ano e meio de investigação realizada por 10 promotores de justiça, 20 servidores da área de inteligência, 20 delegados de polícia e centenas de policiais civis e militares, que prendeu 10 servidores técnicos ambientais, mas nenhum agente político da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos de Goiás - SEMARH (detalhe: então dirigida pelo ilibado deputado federal Jovair Arantes). (In: O Popular. Propina liberava desmatamento. Goiânia, 14 dez. 2010. Cidades)Dentre os servidores presos na malfadada Operação Propina Verde, destacam-se os técnicos ambientais que o signatário conhece desde a década de 90 e com eles trabalhou quando exerceu a incumbência de presidente da Agência Ambiental de Goiás (2003 a 2006): José Rodrigues da Silveira, Paulo Roberto Linhares, Alejandro Alvarado Peccinini, Walquíria das Graças Caldeira e Silva, Antônio Borba Munin, Bernadete Gomes e Lauriano, Eustáquio Ferreira dos Santos e Greide Ribeiro Júnior.
Ao todo, 11 fiscais e técnicos da AGMA foram submetidos às acusações não comprovadas de improbidade administrativa (ato doloso e danoso ao erário com enriquecimento ilícito), tráfico de influência (obter vantagem ilícita), corrupção ativa e passiva (oferecer ou receber vantagem indevida), concussão (exigir vantagem em decorrência do cargo exercido) e peculato (má utilização de recursos públicos).
Greide Ribeiro Júnior, casado com Celma Adriana de Assis, foi servidor público estatutário do Estado de Goiás na função Fiscal Ambiental da Agência Goiana do Meio Ambiente – AGMA que, extinta, foi incorporada à Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Goiás – SEMARH, hoje SEMAD, onde Greide exerceu o cargo de Superintendente de Fiscalização, tendo participado da criação de vários parques estaduais.
O Parque Estadual da Mata Atlântica (PEMA) foi implantado através do Programa de Apoio a Ações Ambientais (P3A), instituído pela AGMA, em 2003. Não houve despesa para o Erário Público. A multinacional Endesa, concessionaria da Usina Cachoeira Dourada S.A. (CDSA), que funcionou durante décadas, até 2003, sem licença ambiental, firmou Termo de Compromisso Ambiental (arts. 72 e 79-A da Lei 9.605/98) com a AGMA. Regularizou a atividade, converteu as multas lavradas pela AGMA na aquisição das terras de proprietários privados pelo preço de mercado, conforme laudo expedido pelo CREA-GO e com recursos privados, estruturou o PEMA, dando quitação ao passivo ambiental com a expedição da licença ambiental definitiva à CDSA pela AGMA.
As ações ajuizadas pelo MP-GO contra Greide Ribeiro Júnior estão associadas ao importante papel que desempenhou na implantação de uma unidade de conservação, localizada na região de terras mais caras da região central do país, sem onerar o erário, por meio da conversão de multas ambientais, preservando uma floresta ameaçada de extinção, com paisagem de rara beleza e elevada biodiversidade.
E mais, Greide Ribeiro Júnior foi acusado de peculato na ação penal, ajuizada em 21 de junho de 2012, proposta pelos promotores de Justiça Denis Augusto Bimbati, Juan Borges de Abreu e Elaine Barbosa da Silveira, do MP-GO, ainda em trâmite no Tribunal de Justiça de Goiás.
O lawfare do MP-GO contra Greide Ribeiro Junior contém todas as características do uso estratégico do direito pelos agentes estatais dos órgãos do sistema de justiça, sobretudo, por ser vítima de ações sem justa causa (falta de autoria e de materialidade) e de overcharging prosecution (imputações destituídas de elementos existentes, verificados ou que podem ser provados).
A característica mais perversa do lawfare contra Greide Ribeiro Júnior se evidencia no resultado morte. No curso da feroz persecução desencadeada por agentes estatais dotados de poder econômico, estrutural e midiático, Greide faleceu em 6/10/2016. A sua condição de saúde sucumbiu ao hálito féretro de caluniosa, difamatória e monstruosa persecução judicial.
Com a morte do réu, o art. 107, I, do Código Penal prevê a extinção do processo, mas, o MP-GO pediu a substituição processual pelo espólio ou sucessores. A viúva Celma Adriana de Assis responde às imputações draconianas e injustas desferidas pelo MP-GO contra o finado marido nas ações civis e penais, nas quais, os pedidos liminares contra a sua liberdade pessoal, quando vivo, e a penhora de bens familiares foram denegados, às expensas de onerosos gastos.
No mérito, as ações contra Greide Ribeiro Júnior, após a sua morte, seguem penduradas como espadas de Dâmocles sobre as cabeças dos seus familiares – esposa, filhos e netos! O insaciável anseio por justiça permanece vivo como chama ardente entre seus familiares, a exemplo da manifestação, nas redes sociais, de um dos filhos de Greide Junior, o Adv. Bruno Campos, verbis:
No decorrer do processo judicial, quando o acusado pode se defender a duras penas e juntar provas da sua inocência, Antônio Borba Munin provou que, ipsis litteris:
[...] o fazendeiro do nordeste goiano era simplesmente meu pai, um sertanejo do agreste goiano, de origem e raízes fincadas nas tradições regionais; quando tinha viagens de fiscalização, que realiza há décadas pela região, ligava para o meu pai e dizia "prepara o bode", pois a carne de bode é um prato tradicional na cozinha do povo do nordeste de Goiás. [...] (TJ-GO. Depoimento de Antonio Borba Munin nos autos do Proc. 0385833-11.2012 - Operação Propina Verde. 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual).
Os fiscais da AGMA percorreram 2.500 quilômetros do cerrado ou 500 por dia. No Nordeste Goiano, onde atua o fiscal Antonio Borba Munin, foram fechados 200 fornos; apreendidos os caminhões de carga de carvão nativo, bem como as cargas de madeira e lenha; e lavradas multas contra carvoeiros, donos de caminhões e das fazendas desmatadas ilegalmente (In: Diário da Manhã .Operação Carvão. Goiânia, 19 dez. 2004. Cidades).A Operação Carvão foi coordenada pelo gerente de Ações Integradas da AGMA, GREIDE RIBEIRO JÚNIOR e a equipe de fiscalização do Nordeste goiano foi comandada pelo fiscal ambiental ANTONIO BORBA MUNIN. Os dois fiscais foram impiedosamente presos, exonerados dos seus cargos, acusados e humilhados pelos órgãos do sistema de justiça lavajatista em Goiás.
O caso José Rodrigues da Silveira
Vamos lembrar: até hoje, todos os gestores que presidem a COMURG saem de lá, ou ricos ou eleitos para cargos no parlamento estadual ou federal. E como saiu José Rodrigues da Silveira, encerrada a gestão de Presidente da COMURG? Deu sequência à sua carreira de engenheiro agrônomo!
[...] o Zé acabou de ser preso; entraram aqui em casa, de madrugada, arrobaram a porta de entrada da casa, do nosso quarto, nos tiraram da cama, de pijama e camisola. Meteram a algema no Zé. Na cabeceira, R$ 30 reais para a compra da padaria do nosso café da manhã. 'Tem comprovação da origem deste dinheiro', perguntaram. Não. 'Então apreende, ponha no envelope. É prova da corrupção'. Levaram os documentos e o computador da sala do escritório do Zé. Eu não sei onde ele está. O que fazer? [...]
O caso Paulo Roberto Linhares e sua filha adolescente
O caso José Ferreira de Souza
O auditor fiscal José Ferreira de Souza foi peça-chave na solução do problema do desmatamento do cerrado para o fim ilegal de produção de carvão nativo, com o consequente contrabando desta mercadoria, de forma clandestina, burlando as barreiras fiscais, para abastecer as siderúrgicas mineiras.
O auditor fiscal José Ferreira de Souza integrou o grupo de trabalho instaurado pelo presidente da Agência Ambiental, no competente processo administrativo, para avaliação e estudos, elaboração do diagnóstico e apresentação do prognóstico sobre a política florestal do estado de Goiás.
Com os resultados do referido processo, à época dos fatos, o signatário solicitou audiência ao governador Marconi Perillo, expôs o problema e a solução apresentada. O governador autorizou a reformulação administrativa do órgão, mediante criação de unidade competente da Dívida Ativa e Recuperação do Ativo Ambiental.
Para ocupar a Gerência de Tecnologia e Cobrança, recém-criada, o governador aceitou a indicação do presidente da AGMA e nomeou o engenheiro agrônomo, advogado e auditor fiscal José Ferreira de Souza, colocado à disposição da AGMA, a pedido do governador, pelo secretário da Fazenda do Estado de Goiás (SEFAZ).
O trabalho do auditor fiscal José Ferreira de Souza permitiu a articulação dos dados fazendários e florestais num só sistema de código de barras, contendo informações sobre a origem, o transporte e destino da carga, representou uma revolução no setor, pois, chegando o caminhão no Posto Fiscal, bastava o número da placa do veículo para visualizar todas as informações necessárias ao controle fiscalizatório.
O caminhão com carga ilegal – carvão nativo destinado a siderurgia – era rapidamente identificado, a multa era lavrada contra o infrator, a carga e o caminhão apreendidos. O problema do consumo de carvão nativo oriundo do cerrado goiano foi solucionado, mediante aplicação das ferramentas adequadas: o comando-e-controle viabilizou a integração fiscal ambiental e tributária e permitiu eliminar o comércio clandestino do carvão nativo (In: O Popular. Fiscais montam cerco a carvoarias. Goiânia, 16 dez. 2004, Capa).

A atuação do auditor fiscal José Ferreira de Souza, assim como dos demais técnicos da AGMA, atraiu a fúria persecutória do MP-GO. Diferentemente dos demais citados, que foram alvos da Operação Propina Verde desencadeada no âmbito da AGMA, em dez. de 2010, José Ferreira, como auditor fiscal da SEFAZ, já não estava lotado na Autarquia Ambiental, tendo retornado ao órgão de origem.
Entrementes, o MP-GO acusou o auditor fiscal de improbidade administrativa na "ação da auditoria nos TACs" pelo exercício do munus publico de Gerente de Tecnologia e Cobrança. Pelo fato atípico de "elaborar o Termo de Referência da Auditoria Externa nos TACs firmados pela AGMA", aprovado pela Diretoria-Executiva da Autarquia Ambiental, constante da Solicitação NR 1114, de 31/07/2004, de Autorização de Licitação para a Contratação da referida auditoria, com pareceres favoráveis da Procuradoria-Geral do Estado (PGE), Secretaria de Planejamento (SEPLAN) e Gabinete do Controle Interno (CGI), responsáveis pela legalidade da Administração Pública do Estado de Goiás.
Estranhamente, os órgãos lavajatistas do sistema de justiça de Goiás, com base em provas ilícitas e falsos testemunhos, impuseram injusta condenação contra o auditor fiscal José Ferreira de Souza em ação de improbidade administrativa, conforme se discorre no subtítulo "A questão da auditoria nos TACs", infra.
O uso estratégico do direito pelos órgãos do sistema de justiça que são adeptos de métodos lavajatistas, vem sendo desenvolvido há três décadas, em Goiás, na sua tripla dimensão: a escolha da jurisdição (1ª dimensão); o manejo draconiano da lei e do aparato policial (2ª dimensão); e a externalidade da mídia opressiva (3ª dimensão) visando o resultado condenatório da vítima como espetáculo teatral penal.
Nesse sentido, em 15/12/2005, três promotores de justiça – Márcio Lopes Toledo, Fernando Braga Viggino e Carlos Alberto Fonseca – e três delegados de polícia – Edilson Divino de Brito, Juarez Carlos Arantes e Ellen Cristina V. G. Cardoso – pediram a prisão preventiva do presidente da Agência Goiana do Meio Ambiente – AGMA, pela sua “conduta ilícita de não responder aos pedidos de centenas de ofícios expedidos pelo MP-GO e protocolados na AGMA" versando, sobretudo, questões relacionadas aos TACs.
A representação foi protocolada na 1ª Vara Criminal da Comarca de Goiânia, mas o seu titular, Juiz de Direito Jesseir Coelho de Alcântara, em 19/12/2005, declinou da competência e remeteu o feito ao Des. Jamil Pereira de Macedo, presidente do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) que, no dia seguinte, decretou segredo de justiça ao pedido de prisão preventiva.
No TJ-GO, em 26/01/2006, o Procurador-Geral de Justiça Substituto, José Eduardo Veiga Braga, o MP-GO requereu a Representação para Decretação de Prisão Preventiva do presidente da AGMA (Representação nº 69-8/198 (200503563468), que, considerada absolutamente inadmissível, foi indeferida pelo Relator, o Des. Aluízio Ataídes de Sousa, em 27/03/2006.
O MP-GO de Cúpula, por intermédio do Procurador-Geral de Justiça Substituto, já citado, interpôs o recurso de Agravo Regimental submetido à decisão colegiada da 4ª Turma Julgadora da 2ª Câmara Criminal do TJ-GO que julgou, verbis:
[...] O substrato fático do pedido não guarda relação de conteúdo com o fundamento invocado [...] (TJ-GO. Representação 69-8/198. 4ª T. da 2ª Câmara Criminal. Julg. 25 abr. 2006)
Inobstante, os agentes estatais lavajatistas que conspurcam o sistema de justiça de Goiás, tramaram prender em flagrante o presidente da AGMA, durante a solenidade pública, realizada em 22/12/2005, no auditório do Palácio Pedro Ludovico, sede do governo estadual, de comemoração dos 30 anos da AGMA, de lançamento do livro “Conversão de Multas Ambientais” e de homologação pública da Lei n° 15.498, de 21/12/2005 que cria a Dívida Ativa Ambiental na AGMA e regulamenta os TACs em Goiás.
Frustrados no seu intento de realizar a desmoralizante prisão em flagrante do presidente da AGMA na solenidade de 22/12/2005, os agentes estatais lavajatistas do sistema de justiça em Goiás não se fizeram de rogado.
É absolutamente desumano que um órgão estatal possa desferir acusações com ampla publicidade, cautelarmente prender, exonerar da função, afastar o acusado do trabalho, instaurar processo que exige gastos de energia, de tempo e de dinheiro com advogado e custas, durante décadas a fio, submetendo o alvo da sanha persecutória a uma variação inusitada de prisão perpétua.
Número 0385833-11.2012.8.09.0051. Área Cível. Dados do Processo. Polo Ativo | Autor: Ministério Público do Estado de Goiás. Polo Passivo | Réus: Agnaldo Lopes; Alaides de Carvalho Pinto; Antônio Borba Munin; Bernadete Gomes e Laureano; Eustaquio Ferreira dos Santos; Greide Ribeiro Junior (sucedido pela esposa Celma Adriana de Assis); Gentil Moreira Carnauba; José Rodrigues da Silveira; Kleuber de Oliveira Sousa; Paulo Roberto Linhares e Henrique Cesar Barros Santana. Disponível em: <https://projudi.tjgo.jus.br/BuscaProcesso>
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Técnicos ambientais da AGMA no Polo Passivo da Operação Propina Verde (TJ-GO. Proc. 385833-11. 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual) |
[...] Histórias terríveis, Osmar. De fato, é preciso pensar o problema do Lawfare a fim de combater qualquer uma de suas múltiplas possibilidades de manifestação. [...] (Profª Drª Helena Esser dos Reis – PPGIDH/UFG, em 30 de jun. 2024)
Qual o objetivo da perseguição contra servidores e técnicos ambientais em Goiás?
Na obra intitulada “Goiânia usurpada: a práxis da propriedade aparente contra a grilagem urbana” (e-Book), publicada pela editora Kelps, de autoria do signatário, resta esclarecido que a feroz perseguição desferida pelo Ministério Público de Goiás - MP-GO contra os técnicos e servidores ambientais de Goiás teve o condão de desmoralizar os órgãos ambientais do poder executivo e levar à extinção a Agência Goiana do Meio Ambiente - AGMA, objetivo alcançado em 2010, com a incorporação das suas funções à Secretaria Estadual do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos, atual Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Goiás (SEMAD).
A extinção da Agência Ambiental de Goiás foi parte do plano estratégico da monopolização, para os órgãos interessados do Parquet, do manejo dos acordos de conversão de multas. Este instrumento de política ambiental, previsto na Lei dos Crimes Ambientais - Lei 9. 605/98 e na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente - Lei 6.938/2009, é competência dos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA (arts. 72 e 79-A da Lei 6.938/98). Os órgãos do sistema de justiça - polícia judiciária, tribunal de justiça e ministério público - não integram este sistema, sendo vedado ao delegado, promotor ou magistrado firmar TACs na esfera administrativa.
Praticando ativismo judicial e ingerência administrativa, os representantes do MP-GO lograram no Tribunal de Justiça de Goiás a declaração de inconstitucionalidade da Lei n° 14.498, de 21 de dezembro de 2005 – aprovada por unanimidade pela Assembleia Legislativa do Estado de Goiás. E, mais ainda, os destemidos e corajosos agentes estatais persecutores do MP-GO desencadearam feroz persecução, não contra os agentes que poluem, desmatam e degradam a natureza, mas contra as pessoas do então presidente e dos técnicos do órgão do Meio Ambiente que promoveram a recuperação do ativo ambiental, por meio da aplicação da ferramenta de conversão de multas.
Nada há de inconstitucional numa lei que confere ao órgão competente do Estado de Goiás o instrumental previsto no Sistema Nacional do Meio Ambiente para fiscalizar o meio ambiente, lavrar as penalidades contra o poluidor das águas, do solo e do ar ou contra aquele que desmata ilegalmente.
Dessa maneira, a absurda declaração de inconstitucionalidade da Lei Estadual de Goiás n° 14.498/2005 configura gritante ingerência do sistema de justiça sobre o Pacto Federativo Ambiental (art. 225 da Constituição Federal), desvirtuando sagrado dispositivo, segundo o qual, todos têm direito ao meio ambiente sustentável, incumbindo ao poder público e à sociedade o dever de preservá-lo às atuais e futuras gerações.
Epítome de um fenômeno neocolonial
O ativismo judicial e a ingerência do sistema de justiça configuram em Goiás o uso estratégico do direito contra alvos previamente selecionados – o inimigo – para o alcance de finalidades políticas, geopolíticas ou econômicas alheias à noção de justiça.
i) O ajuizamento de inúmeras ações de improbidade administrativa, do pedido judicial de decretação de prisão cautelar do presidente da Agência Ambiental que, mesmo em segredo de justiça e denegado pelo Tribunal de Justiça, foi divulgado na grande mídia pelos autores do pedido (3 delegados e 3 promotores) e a declaração de inconstitucionalidade da Lei estadual nº 14.498/2005 que impediu a instituição da Dívida Ativa na Autarquia Ambiental de Goiás.
ii) A deflagração da ostensiva Operação Propina Verde, pelo MP-GO, “de combate à maior corrupção da história de Goiás” com a prisão cautelar de 10 técnicos e servidores da Agência Ambiental, em dezembro de 2010.
iii) Em corolário à desmoralização institucional causadas pelas denúncias de corrupção, prisões e publicidade negativa, a Agência Goiana do Meio Ambiente foi extinta, em 2010, e suas funções foram incorporadas à SEMAD, que, por ser da administração direta, não possui agilidade para a execução fiscalizatória.
As ações supra descritas foram conectadas para alcançar um objetivo estratégico. O “mar de lama da corrupção’’ desmoralizou a autarquia, impediu a instituição da Dívida Ativa Ambiental, impediu o seu fortalecimento institucional com procuradoria e auditoria ambiental, cobrança e ajuizamento dos débitos ambientais.
Frise-se: denúncias de corrupção, persecução judicial e prisões ocorreram por ingerência do sistema de justiça. Exemplo solar disso: a declaração de inconstitucionalidade da Lei 14.498/2005, o enfraquecimento administrativo, institucional e moral de uma instituição do poder executivo ambiental. Tudo isso criou condições para promover a extinção da autarquia; permitiu o alcance de um objetivo estratégico adredemente planejado pelo Parquet.
Qual seja, viabilizou o monopólio nas mãos dos representantes do MP-GO dos instrumentos de negociação e ajuste dos valores das multas lavradas pelos órgãos competentes do poder executivo de controle da qualidade do meio ambiente e do uso do solo, sobretudo estadual, mas também municipal de Goiânia, e dos demais municípios do estado, a favor do próprio MP, segundo políticas estabelecidas por promotores e procuradores de justiça.
Qual o custo dessa ingerência do sistema de justiça na vida do cidadão?
A ingerência do sistema de justiça sobre a política pública de meio ambiente em Goiás resultou na manutenção da iniquidade de um status quo absurdo, baseado no calote ambiental praticado em terra goyazes! De cada 100 reais de multa, míseros 3 centavos são arrecadados. Isso ocorre por que a Dívida Ambiental em Goiás é cobrada pela Dívida Tributária da Secretaria Estadual da Fazenda - SEFAZ. Os autos de infração lavrados pela AGMA permanecem inativos nos escaninhos da SEFAZ. Passados 5 anos, perdem sua validade, viram papéis podres. O infratores permanecem livres para poluir, desmatar e degradar o meio ambiente, as águas e o cerrado. Com os beneplácitos do sistema de justiça!
Nesse ambiente de conspurcação, os promotores de justiça do MP-GO “fazem a festa”, onde bailam a ingerência, a intromissão, o desvio e o abuso de poder. A matéria de propaganda da promotora Marta Moriya é bastante elucidativa (in: O HOJE. Promotora é sinônimo de conciliação e cobrança em Senador Canedo, em 8 fev. 2024).
Na matéria supra, publicada por jornal de uma das cidades mais importantes do estado, Senador Canedo, que integra a Região Metropolitana de Goiânia, a promotora é apresentada como ‘‘sinônimo de conciliação’’, ou seja, sinônimo de TAC, que é um instrumento de ajuste administrativo de competência do poder executivo. Veja.
Quem lavra infração referente ao uso do solo e ao meio ambiente local é o órgão municipal, mas, segundo a matéria, nada escapa à ação onipresente da promotoria de justiça, emitindo alertas nas áreas de segurança pública, meio ambiente e uso do solo, firmando TACs e até punições que afetam o bolso.
À guisa de conclusão, pode-se afirmar que a monopolização dos TACs pela promotoria de justiça em Goiás não pacifica a sociedade, intensifica o conflito entre as partes envolvidas, agrava os problemas ambientais, aumenta o rombo do erário e fragiliza ainda mais os direitos humanos, como visto alhures.
A identificação do problema e sua solução
O problema aqui abordado se relaciona ao desenvolvimento sustentável por meio de instrumentos de políticas públicas a serem adotadas nas esferas de competência da União, dos Estados e dos Municípios.
O comando-e-controle concebe mecanismos de fiscalização, monitoramento, tributação, penalização, embargos, interdição, licenciamento, autorização e demais ferramentas de adequação das atividades socioeconômicas ao padrão legal estabelecido.
Os SGAs, por sua vez, têm no comando-e-controle o ponto de partida para o desenvolvimento baseado em estímulos e compensações auferidos pelos benefícios e serviços ambientais proporcionados pelas atividades sustentáveis.
A Agência Ambiental desenvolveu as ferramentas relacionadas nas concepções de comando-e-controle e de gestão ambiental sustentável na tentativa de solucionar os problemas do desenvolvimento em Goiás (In: Diário da Manhã. Atlas sobre o Cerrado - estudos discute novas possibilidades de desenvolvimento sustentável na região. Goiânia, 28 abr. 2005, Cidades, p. 2a).

Aplicações das concepções C-E-C e SGA
Um exemplo digno de nota de aplicação do comando-e-controle foi o combate ao mercado clandestino, então praticado à luz do dia, do carvão nativo do cerrado, destinado a abastecer as siderúrgicas mineiras.
O problema do carvão nativo do cerrado
Toda a cadeia produtiva da madeira fica obrigada a promover o reflorestamento florestal de árvores energéticas com a finalidade de manejo florestal, corte, carvoaria, transporte e consumo. A mercadoria transportada, como carvão, madeira e outros produtos derivados do desmatamento ou corte florestal teriam que comprovar a origem e o destino do produto.
Quando o signatário assumiu a presidência da Agência Ambiental, em janeiro de 2003, a Lei Florestal de Goiás estava sendo violentada às escâncaras, sob o olhar complacente de todas as autoridades do poder público – Judicial Legislativo e Executivo, bem como de todos os cidadãos e suas entidades, impotentes diante da agressão, bem como da imprensa pequena, média e grande, muda, cega e surda diante de fato tão grave.
Na primeira reunião da Diretoria-Executiva da Autarquia Ambiental de Goiás, o missivista apresentou a proposta de aplicação dos mecanismos de comando-e-controle e de gestão ambiental para a solução do problema do carvão nativo do cerrado. Para isso, era preciso diagnosticar a realidade então existente.
Feito isso, estando conforme a lei, a Agência Ambiental expedia a autorização de desmatamento, com as coordenadas delimitando o local, a propriedade, o proprietário e o município. Toda autorização de desmatamento era acompanhada do selo florestal correspondente à quantidade em estéreis ou metros cúbicos lineares de carvão ou de outro produto florestal gerado no caso concreto.
Como se pode facilmente suspeitar, esse sistema de controle possui fragilidade evidente: o selo emitido para uma determinada autorização de desmatamento era repetidamente utilizado para o transporte de inúmeras cargas de transporte da mercadoria.
Para constatar o tamanho do estrago, o presidente da autarquia aprovou, na referida reunião da Diretoria-Executiva da Agência Ambiental, em janeiro de 2003, a realização de auditoria nas contas florestais dos médios e grandes consumidores de produto florestal cadastrados na Agência.
A auditoria foi feita e o resultado não poderia ser outro: 100% das Siderúrgicas Mineiras cadastradas consumiam produto florestal de origem nativa. Restou provado o contrabando do carvão nativo de Goiás para as siderúrgicas mineiras. Os caminhões carregados de carga clandestina formavam filas nas rodovias do nordeste goiano rumo a Minas Gerais. Os postos de fiscalização tributária nas fronteiras GO – MG eram incapazes de constatar a fraude e impedir a evasão fiscal.
Evidenciado o passivo ambiental do consumidor de produto florestal para com o cerrado goiano, a Agência Ambiental – AGMA desenvolveu o mecanismo de negociação e ajuste de conduta junto ao devedor desse passivo, representado pelo Sindicato do Ferro do Estado de Minas Gerais – SINDIFERRO/MG.
A AGMA negociou e firmou com o SINDIFERRO/MG um TAC de recuperação do passivo a ser convertido na preservação de uma área prioritária para preservação da biodiversidade, equivalente ao passivo florestal das siderúrgicas mineiras, para implantação do Parque do Pantanal Goiano, no Vão do Paranã em Goiás, conforme levantamento do Projeto de Áreas Prioritárias para a Preservação do Bioma Cerrado/Convênio Banco Mundial (In: O Popular. Indicadas áreas para preservação. Goiânia, 14 nov. 2004. Cidades, p.4)
Como se constata na matéria supra, mais uma vez, a exemplo da pretensa recuperação de valores estratosféricos anunciados pelo MP-GO na Operação Propina Verde, a dimensão estratégica da externalidade, ou seja, dos meios de comunicação, por parte do MP-GO, configura elemento essencial às condutas antijurídicas do lawfare.
O suprassumo da perversidade persecutória
E tudo isso, com muita publicidade negativa nos meios de comunicação social. A estratégia da mídia opressiva visa agravar a situação do acusado, dificultar, imobilizar e asfixiar a capacidade de defesa para o alcance condenatório.
As acusações foram ostensivamente veiculadas na mídia. O clima de “ilegalidade e improbidade” na Autarquia Ambiental levou o governador do estado de Goiás a acionar o Procurador-Geral do Estado para discutir o problema com o presidente da Agência Ambiental.
Dessa forma, no regular processo de licitação, pelo rito autorizado da inexigibilidade, foi contratada a empresa Tributo Advocacia Empresarial, representada pela advogada Maria Aparecida de Castro Ferreira Morgado, auditora fiscal e contadora, especialista em Direito Tributário, Direito do Trabalho e Políticas Públicas e com experiência no Conselho Administrativo Tributário da SEFAZ.
A auditoria foi realizada, o relatório publicado no Diário Oficial do Estado e o resultado apresentado e discutido em sessões públicas realizadas no auditório da Agência Ambiental e na Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás. O serviço contratado foi entregue no prazo estipulado e pago no valor autorizado no competente processo administrativo, resultando em ganhos de eficiência e melhoria do instrumento de recuperação do crédito ambiental em Goiás.
Inobstante a ausência de qualquer resquício de prejuízo ao erário e nenhuma sombra de enriquecimento ilícito por parte dos acusados, estes foram condenados às penas draconianas da antiga Lei de Improbidade Administrativa, inclusive a reparação de inexistente prejuízo aos cofres públicos correspondente ao contrato assinado, após autorização dos órgãos de controle interno do Estado de Goiás, no valor de R$ 52 mil, mais multa cível.
O TJ-GO impôs arbitrariamente ao réu indefeso a perda dos direitos políticos, proibição de contratar ou receber recursos públicos por 5 anos, ressarcimento ao erário de R$ 5,75 milhões, além de multas astronômicas, pelo crime de entabular a conversão de multas com infratores ambientais, sem licitação, em bens e serviços entregues à AGMA, verbis:
EMENTA. DUPLA APELAÇÃO CIVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. [...] Entabulação de Termo de Ajustamento de Conduta [TACs] pela extinta AGMA com autuados. Possibilidade. Substituição das multas por bens destinados à própria Autarquia. [...]. Lesão ao Erário Público. Perda patrimonial. Ato atentatório aos princípios da Administração Pública. Sanções aplicáveis. Ressarcimento ao Erário. Importe limitado de ofício. Princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. (TJ-GO. AC nº 54615-90.2005.8.09.001. Relator Des. Luiz Eduardo de Sousa. Data Publ. 22 mar. 2017) (grifos nossos)
A nova Lei de Improbidade Administrativa - LIA nº 8.429/92, com as alterações introduzidas pela Lei 14.230/21, veda a condenação de reparação ou ressarcimento em ações de improbidade administrativa sem a comprovação do dolo (vontade consciente de praticar o ilícito), causando prejuízo ao poder público (dano ao erário) com o consequente enriquecimento ilícito do agente ou preposto. O MP-GO, nas exordiais das respectivas ACPs, não aponta qualquer sombra de dúvida na conduta do acusado, dada a completa ausência de elementos que apontem para a prática desonesta de propina, desvio de recurso público, superfaturamento ou enriquecimento ilícito!
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[1] Pesquisador pós doutor associado ao Núcleo de Direitos Humanos da UFG; doutor em Ciências Ambientais; mestre em Ecologia; bacharel em Biologia, Agronomia e Direito, todos pela UFG, exceto o último, pela UNIP; diretor Científico da Egress@s UFG, membro titular da cadeira 29 da Academia de Letras de Goiânia (AGnL) e da cadeira 69 do Instituto Cultural e Educacional Bernardo Elis para os Povos do Cerrado (ICEBE).