Osmar Pires Martins
Júnior
A Constituição do Brasil estabelece,
no caput do art. 5°, que todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, efetivando no art. 3°, inciso IV, o princípio da promoção do
bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação.
A Lei Maior do país, portanto, proíbe
o preconceito e a discriminação das pessoas, em razão do sexo (homem, mulher ou
orientação sexual), da cor da pele (branco, negro, pardo), da etnia (branco,
pardo, negro, indígena, mulato, caboclo, cafuzo), da idade (criança,
adolescente, idoso) ou da origem (seja ela geográfica ou social).
O Código Penal tipificou a conduta do
crime de "injúria racial" no art. 140, § 3º, que consiste em
"ofender a dignidade ou o decoro de alguém, utilizando elementos de cor,
raça, etnia, origem ou condição de idade, sexo ou estado físico".
Já o crime de racismo, previsto na
Lei dos Crimes de Preconceito - Lei nº 7.716/89, implica em conduta
discriminatória dirigida a um determinado grupo ou coletividade.
O art. 1º desta lei diz que
"serão punidos os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de
raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional".
A campanha eleitoral em curso repete
uma conduta que ocorreu na anterior. Estamos a presenciar a reiteração de
ostensivas manifestações racistas contra as pessoas do nordeste ou injuriosas
contra determinada pessoa, ou ainda por sua procedência social, especialmente
os de "origem humilde", ambos os crimes (racismo e injúria racial) abusivamente
praticados com o dolo da discriminação e da ofensa.
Após o resultado das eleições do
primeiro turno das eleições presidenciais em 2014, os racistas e injuriadores intensificaram
sua atividade, fazendo uma relação espúria e improcedente entre o voto dos
brasileiros do norte/nordeste e o voto dos brasileiros do sul/sudeste.
O voto do N/NE seria de gente "burra",
pois pretensamente depositado em favor da candidata a presidente do PT; já o
voto do S/SE seria de gente "inteligente", pois que se destinaria ao
do PSDB.
Tais manifestações de racismo "viralizaram" na rede social, partindo de pessoas que se colocam em posição social privilegiada , seja pelo poder econômico, seja pelo local de moradia e domicílio, sempre no sentido de denegrir e ofender os nordestinos.
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Manifestações de racismo no facebook contra os nordestinos por votarem na candidata Dilma, do PT. |
O quadro se torna mais grave ao se constatar que a conduta criminosa de racismo parte de pessoas públicas, como a discriminação contra os piauienses desferida por veterana jornalista da Rede Globo em postagem realizada na sua página virtual
na internet.
Impõe-se falsear e desmascarar o
preconceito de que uma população beneficiária da prestação obrigatória de
serviços e obras públicas seja alvo de discriminação.
Todo governante está
obrigado a efetivar a norma constitucional do art. 170, VII, que diz: "a
ordem econômica tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme
ditames da justiça social, observado o princípio da redução das desigualdades
regionais e sociais".
Ora, se determinado
governante recebeu votação expressiva por cumprir sua obrigação, e não
favor, inconcebível que recaia sobre a população qualquer manifestação
preconceituosa.
Desafortunadamente,
a visão e opinião da jornalista da Rede Globo, que é do conhecimento público,
sobre a Presidenta Dilma, de indignação à expressiva votação que ela obteve no
estado do Piauí, recaiu contra o povo piauiense em face da origem do
eleitor.
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Post da veterana jornalista da Rede Globo que circula na internet contendo manifestação de preconceito racial contra os nordestinos do estado do Piauí |
Tal abordagem
preconceituosa e discriminatória está sugerida no comentário da jornalista
platinada na sua página virtual @LeilaneNeubarth: "Em SP Dilma tem até
agora 25% dos votos, já no Piauí ela tem 71% dos votos. Isso dá o que
pensar...".
A jornalista
estimula a pensar, não que a votação de Dilma no Piauí é alta porque o
governante desenvolveu políticas públicas de atenção básica aos cidadãos. Em
sentido contrário, a autora do post, de forma explícita, induz e
reforça o caráter discriminatório contra os nordestinos, como sendo
supostamente beneficiários de favores dos governantes, a exemplo da “bolsa-família”
designada como "bolsa-esmola" e tantos outros termos pejorativos
contra as políticas sociais do governo trabalhista, vociferados pelos
missivistas da Rede Globo..
O art. 20 da citada
Lei dos Crimes de Preconceito tipifica: "Praticar, induzir ou incitar a
discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência
nacional. Pena - reclusão de um a três anos e multa".
A conduta analisada
pode ser agravada em razão do disposto no § 2º do art. 20 da Lei dos Crimes de
Preconceito: "Se qualquer dos crimes previstos no caput é
cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de
qualquer natureza. Pena - reclusão de dois a cinco anos e multa".
O caso ganha
contorno de interesse público por se tratar de racismo e ofensa contra os
nordestinos, desferidos por parte de personalidades públicas que exercem a
nobre função constitucional da informação e formação em emissora concessionária
de serviço público de comunicação social (arts. 220 a 224 da Constituição).
O art. 221, IV, da
nossa Carta Mãe obriga as emissoras e os prestadores do serviço de comunicação
social a respeitarem as finalidades da informação voltadas à promoção da
cultura nacional e regional, os valores éticos e sociais da pessoa e da
família, seja ela de São Paulo ou do Piauí, sem qualquer discriminação e
preconceito.
Esta e todas as
manifestações discriminatórias e preconceituosas merecem o pronto repúdio dos
defensores da lei e dos que pregam a solidariedade entre as pessoas e os
brasileiros em particular, além de merecer a repulsa dos que amam a
verdade.
A candidata Dilma,
do PT, foi de longe a mais votada em Minas e no Rio de Janeiro; além de liderar
a votação no Rio Grande do Sul.
Portanto, a
discriminação peca não só por violar os fundamentos constitucionais e legais de
respeito à dignidade da pessoa humana, mas também por humilhar a inteligência
dos que possuem a mais básica noção de geografia!
Por isso, merece
louvor a iniciativa do Ministério Público Federal, anunciada no dia oito de outubro último, de que está
monitorando as redes sociais para identificar e adotar as medidas cabíveis contra os agentes infratores da lei.
Há que diferenciar
comportamentos que tipificam crimes contra a honra daquele que procura o debate
político.
Por exemplo, a
assertiva de que "o neotucanismo da candidata Marina Silva, do PSB, escorado no neoliberalismo do
PSDB, em propor a independência do Banco Central, representa subtrair o emprego
e afastar a comida da mesa do trabalhador" não pode, jamais, ser
enquadrada como conduta criminosa.
Afirmar o contrário
seria criminalizar o debate político e torná-lo tão estéril que a eleição e o
voto perderiam o sentido!
Osmar Pires Martins
Júnior é escritor da Academia Goianiense de Letras, doutor em C. Ambientais,
mestre em Ecologia, biólogo, engenheiro agrônomo e bacharelando em Direito.
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