Blog do Osmar Pires

Espaço de discussão sobre questões do (ou da falta do) desenvolvimento sustentável da sociedade brasileira e goiana, em particular. O foco é para abordagens embasadas no "triple bottom line" (economia, sociologia e ecologia), de maneira que se busque a multilateralidade dos aspectos envolvidos.

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Pós-Doc Dir. Humanos PPGIDH-UFG, D.Sc. C. Ambientais, M.Sc. Ecologia, B.Sc. Direito, Biologia e Agronomia. Escritor Academia de Letras de Goiânia. Autor de A gestão do espaço urbano e a função socioambiental da cidade. Londrina, PR: Sorian, 2023. 404p. O efeito do combate à corrupção sobre os direitos humanos... Goiânia: CegrafUFG, 2022. 576p. Família Pires... 3. ed. Goiânia: Kelps, 2022. 624p. Perícia Ambiental e Assistência Técnica. 2. ed. Goiânia: Kelps/PUC-GO, 2010. 440p. A verdadeira história do Vaca Brava... Goiânia: Kelps/UCG, 2008. 524p. Arborização Urbana e Qualidade de Vida. Goiânia: Kelps/UCG, 2007.312p. Introdução aos SGA's... Goiânia: Kelps/UCG, 2005. 244 p. Conversão de Multas Ambientais. Goiânia: Kelps, 2005, 150p. Uma cidade ecologicamente correta. Goiânia: AB, 1996. 224p. Organizador/coautor de Lawfare como ameaça aos direitos humanos. Goiânia: CegrafUFG, 2021. 552p. Lawfare, an elite weapon for democracy destruction. Goiânia: Egress@s, 430p. Lawfare em debate. Goiânia: Kelps, 2020. 480p. Perícia Ambiental Criminal. 3. ed. Campinas, SP: Millennium, 2014. 520p. Titular da pasta ambiental de Goiânia (93-96) e de Goiás (03-06); Perito Ambiental MP/GO (97-03).

Monday, June 08, 2020

HOMENAGEM A FERNANDINHO: UMA REFERÊNCIA PARADIGMÁTICA DO FUTEBOL-ARTE

Osmar Pires Martins Junior
Pesquisador pos-doc em Direitos Humanos PPGIDH-UFG 

Hugo Fernando Bonfim Queiroz "Fernandinho" faleceu vítima de câncer, em 05/06/2020, na cidade de Goiânia, onde residia como um respeitado comerciante e construiu brilhante carreira de futebol 

No dia 5 de junho 2020 faleceu Fernandinho, aos 70 anos, o melhor craque de todos os tempos revelado pelo futebol goiano, último titular da ponta-direita do Santos Futebol Clube de Pelé. 
Fernandinho com sua família, no final da década de 1950, chegou à cidade de Anápolis, vindo do interior da Bahia, num pau de arara dirigido pelo seu pai. Com doze anos de idade, começou nas categorias de base do Anápolis. Em 1970, veio para o Campinas, quando o clube campineiro foi incorporado ao Vila Nova. pasando a vestir a camisa colorada ao lado de Guilherme, seu ídolo. 
Eu e meus irmãos Ismar Pires Martins, Eliomar Pires Martins, Dilmar Santos Pires Martins, testemunhamos a atuação de Fernandinho ainda no Estádio Olímpico nos dois jogos da decisão do Campeonato Goiano 1973 e depois na jornada do Tetra (1977, 78, 79 e 80), já no Serra Dourada. 
No Vila Campeão de 1973, jovens talentos como Fernandinho, Natinho e Carlos Alberto, de um elenco com média de idade de 24 anos. No gol, a experiência do espetacular Luizinho (28 anos). 
Nas formações campeãs do Vila de 1969 e 1973 despontaram atletas com lugar certo na seleção dos jogadores da história do futebol goiano: Bajoso, Davi, Mosca, Curió, Guilherme, Lincoln, Fernandinho. 

Vila Nova 1970. Em pé: Davi, Curió, Bajoso, Nélson, Zé Carlos e Altamiro. Agachados: Furquim, Lincoln, Guilherme, Mosca e Araldo (Davi, Curió, Bajoso, Lincoln, Guilherme e Curió, ao lado de Fernandinho, integram a Seleção dos Melhores Jogadores da História do Futebol Goiano). 

GERAÇÃO DE OURO 
Uma Geração de Ouro alegrou o futebol goiano entre as décadas 1970, 1980, 1990, 2000, sobretudo 70/80 quando existiam quatro grandes clubes na Capital - Vila Nova Futebol Clube, Atlético Clube Goianiense, Goiânia Esporte Clube e Goiás Esporte Clube, além das agremiações competitivas nas cidades do interior que se sagraram campeões ou vice das competições estaduais, como CRAC de Catalão, Goiatuba, Anapolina e Anápolis, lançando jogadores e fazendo a festa da torcida. 
Da geração dourada do futebol goiano, lembro de jogadores como os esmeraldinos Matinha, Uidemar (vendido ao Flamengo, onde foi titular muitos anos), Túlio Maravilha e Carlos Alberto Santos (transferidos para o Botafogo, onde foram campeões e ídolos), Luvanor (vendido para o Catânia da Itália, encerrou no Vila), Zé Teodoro (irmão de Fernandinho, foi campeão mundial pelo São Paulo, jogou na Seleção Brasileira), Fernandão (transferido para o Internacional, ídolo e campeão mundial). 
O Atlético Clube Goianiense revelou Paghetti, que se tornou estrela no Goiás; Baltazar, que jogou no Grêmio, Flamengo (ao lado de Zico), Palmeiras, Atlético de Madrid e Seleção Brasileira (campeão do Torneio de Toulon na França); e Valdeir, o The Flash do Botafogo, onde foi ídolo. 

GOIÂNIA ESPORTE CLUBE: CELEIRO DE CRAQUES
O Goiânia foi um berçário de craques como Luiz Frazão, Tuíra, Marco Antônio e Rogério, que se projetaram no Goiás; Bill e Héber, que vestiram as camisas do Goiás, Internacional e Grêmio. 
No último título do Galo, em 1974, e no Brasileirão, em 1975, vestiram a camisa alvinegra Marco Antônio, Rogério, Héber, Guilherme, Bill, Curió. 
O Goiânia foi a primeira vítima do esvaziamento do futebol regional em decorrência de uma "nacionalização autoritária" do futebol brasileiro, fomentada pela ditadura militar e seguida pela CBF após a redemocratização em articulação com a grande mídia comercial comandada pela Globo.
  
A BATALHA DE 1973 
Voltando à decisão do Goianão de 1973. Na primeira partida, Fernandinho marcou o primeiro gol do Vila, decretando a vitória de 2x1 contra o Goiás. 
Na segunda, em 23 de agosto de 1973, o juiz parcial expulsou dois jogadores do Vila, dentre eles Fernandinho. 
No tempo regulamentar, além das expulsões, o juiz deu dois pênaltis a favor do Goiás. Até o presidente da FGF declarou o erro da arbitragem na marcação das penalidades. 
A decisão foi para a prorrogação, que ficou zero a zero e para os pênaltis. Luizinho no gol do Vila era uma barreira intransponível. 
Dai o boicote esmeraldino: a decisão não poderia acontecer; a estratégia seria anular o jogo. As luzes do estádio foram desligadas. O árbitro iria euxecutar a estratégia do Goiás. 
A torcida colorada percebeu a "jogada"; não arredou pé do estádio; encurralou o time esmeraldino e a arbitragem dentro dos vestiários, até que as luzes voltaram e a partida foi retomada. 
A decisão do Campeonato foi para os pênaltis. Luizinho fez o que o adversário mais temia: pegou as bolas batidas pelos trêmulos jogadores de verde. O jogo encerrou às duas horas da madrugada... 
Não adiantou a roubalheira. O Vila foi Campeão Goiano de 1973 na bola rolada no gramado, dentro do campo de futebol. 
O ganhador do título do Goianão definiria o dono da única vaga goiana para o Campeonato Brasileiro 1973 (só tinha uma série, o Brasileirão). 
Não adiantou o Vila ganhar dentro de campo. O Goiás foi escolhido no tapetão pela Ditadura Militar.


FERNANDINHO E PELÉ
Em 1974, Fernandinho foi emprestado pelo Vila para o Santos. É o único jogador goiano que jogou com Pelé, o maior craque de todos os tempos do futebol mundial. 
Ao lado de Pelé, Fernandinho conquistou títulos e voltou para o Vila, depois que Pelé parou de jogar no Santos. 
Pelé retomou a carreira no New York Cosmos, entre 1975 e 77, quando popularizou o futebol nos Estados Unidos.

Equipe do Santos que bateu o Palmeiras de 4x0 no Morumbi, em 20/04/1974. Em pé, da esquerda para a direita: Cejas, Hermes, Turcão, Marinho Peres, Vicente e Clodoaldo. Agachados: Fernandinho, Brecha, Nenê, Pelé e Mazinho. Nesse jogo, Fernandinho deu o passe para o último gol de Pelé com a camisa alvinegra e ainda fez um gol. 

INAUGURAÇÃO DO SERRA DOURADA 
Na inauguração do Estádio Serra Dourada, em 09 de março de 1975, com público pagante de 70 mil pessoas, o técnico Paulo Gonçalves convocou Fernandinho, recém chegado do Santos. 
A Seleção Goiana ganhou da Seleção de Portugal por 2 x 1. O primeiro gol foi jogada de Fernandinho, em contra-ataque rápido pela direita, dando o passe para Lincoln, que fez o gol; as movimentações de Tuíra e Paghetti confundiram a defesa portuguesa. Tuira fez o segundo gol. 
A seleção goiana ganhou o jogo, convenceu e fez a festa da torciada. O futebol de alto nível encantou os comentaristas com belas jogadas, deslocamentos, lançamentos e armação de jogo de Paghetti, Lúcio Frasson, Tuíra, Lincoln e Fernandinho. 
Selecao Goiana 1975. Em pé: Nilson, Macalé, Alexandre Neto, Matinha, Lula e Lúcio Frasson; abaixados: Fernandinho, Lincoln, Paghetti, Piorra e Raimundinho (Foto: O Popular)

EPOPÉIA DO TETRA 
Fernandinho foi campeão goiano em 1977, dando a largada para o Tetra - 1977, 78, 79 e 80. 
O Vila, que foi o primeiro TRI (1961, 62 e 63), passou a ser também o único TETRA do futebol goiano; curiosamente, o Goiás hegemonizou a vaga do estado para o Brasileirão. 
Na jornada do Tetra, Fernandinho atuou com um plantel do nível de Toninho Almeida (revelado pelo Cruzeiro onde jogou ao lado de quatro fenômenos do futebol brasileiro, os inesquecíveis tricampeoes mundiais Piazza e Tostão, além dos fora-de-série Zé Carlos e Dirceu Lopes); Humberto Ramos, Paulinho e Danival (contratados junto ao Atlético Mineiro, onde foram campeões brasileiros), Jorge Vitório e Erivelto (contratados do Fluminense, onde jogaram ao lado dos titulares da Super Seleção Canarinho Rivelino, Paulo César Caju, Carlos Alberto Torres, Félix e Edinho).

No pôster da revista Placar, despontam talantosos pratas da casa Zé Luis, Cândido e Luisinho ao lado de craques revelados no futebol goiano Modesto, Serginho, Roberto Oliveira, Luis Dário e Tulica, sob a regência dos astros nacionais Danival, Zé Ronaldo e Paulinho

VILA, CELEIRO DE CRAQUES
Fernandinho foi um ídolo que influenciou a formação da safra mais talentosa do futebol goiano. De sua época são os pratas da casa revelados pelo Vila - Timoura, Gabriel, Zé Luis, Valdo, Cândido, Dionísio, Sérgio Donizeti, Luizinho, Sérgio Luis, Rui, Zé Henrique, Roni, Luciano, Tim, Wando, Christian, Donizetti, Paulo Ramos, Pedro Junior e Fernando, campeões em 1993, 1995, 2001 e 2005. 

Roni com as camisas da Seleção Brasileira e dos clubes Santos, Flamengo e Fluminense

O atacante Roni, campeão em 1995 e o volante Fernando, campeão em 2005 (último título do Tigrão), ganharam projeção nacional e internacional.
O atacante Roni, vendido ao São Paulo, em 1996, jogou nos grandes centros onde foi campeão nos torneios estaduais pelo Fluminense (1997 e 2001), quando foi convocado para a Seleção Brasileira principal (1999); pelo Atlético Mineiro (2006); Flamengo (2007); Cruzeiro (2008); Santos, onde fez dupla de ataque com o jovem Neymar (2009); encerrando carreira no Vila Nova, em 2012.
O voltante Fernando foi vendido por R$ 1 milhão ao Porto de Portugal, em 2007, onde disputou 236 jogos, conquistou quatro Supertaças de Portugal, quatro Campeonatos Nacionais e uma Liga Europeia, sendo convocado para a Seleção Portuguesa para disputar a Copa do Mundo de 2014. Transferiu-se para o Manchester City em 2014, onde disputou 101 jogos. Em 2017, com 30 anos de idade, o seu passe foi adquirido pelo Galatasaray, da Turquia, por quase seis milhões de euros, cabendo ao Vila Nova 2% deste valor. Desde 2017 joga no Sevilha, da Espanha.

Fernando, revelado pelo Vila Nova, vestiu as camisas do Futebol Clube do Porto e Manchester City

UM DOS CINCO GRANDES QUANDO O BRASIL ERA RESPEITADO
O futebol goiano já foi um celeiro de craques e despontou entre os cinco estados do Brasil no período em que o escrete canarinho ainda era respeitado. Dos gramados goianos despontaram valores da qualidade de Zé Ronaldo, Roberto Oliveira, Luiz Dário, Anderson, Bé, Aloísio, Araújo, Josué, Danilo. 
No período da Geração de Ouro, os adeptos do futebol-arte registraram nas suas memórias jogadas geniais de contra-ataques rápidos, lançamentos em profundidade, revezamento e triangulação pela direita ou pela esquerda. 
Pela direita destacaram: Lúcio Frasson (que foi vendido pelo Vila ao Internacional - o bicampeão brasileiro com Falcão, Manga, Carpegiani), Tuíra (consagrado no Goiás, encerrou a carreira no Vila) e Fernandinho (no auge da carreira, encerrada com menos de 30 anos de idade, em 1980). 

OCASO DO FUTEBOL REGIONAL 
O legado de Fernandinho é valioso em vários aspectos, além do futebol. Ele deixou um ensinamento aos profissionais da bola, de que é preciso planejar a carreira, conciliar com a formação pessoal, já que o jogador se aposenta em plena idade produtiva para outras atividades. 
Fernandinho não se deixou levar pelas glórias passageiras do glamour dos gramados. Ele desenvolveu formação universitária que lhe permitiu seguir a vida com dignidade, na atividade de bem sucedido empreendedor comercial. 
A lição de Fernandinho se tornou ainda mais evidente após a redemocratização e Constituição Federal de 1988, que deixou uma lacuna no futebol, decorrendo o ocaso do futebol regional e, de consequência, o enfraquecimento do futebol nacional, levando à posição vergonhosa de a goloriosa Seleção Canarinho levar uma goleada de 7 x 1 para a Alemanha em casa na Copa do Mundo da FIFA de 2014! 

MÁFIA DO FUTEBOL 
A CBF e as Federações de Futebol não foram democratizadas, mantiveram estrutura e hierarquia autoritária herdadas do regime militar. 
Essa estrutura foi apropriada pela Máfia do Futebol da FIFA, uma organização criminosa associada aos conglomerados de televisão que submete os clubes de futebol aos seus domínios. 
O futebol se transformou numa grande lavanderia do dinheiro da corrupção, jogatina, tráfico de armas e drogas. 
Uma peça dessa engrenagem criminosa é o Clube dos 13 que monopoliza as verbas das loterias e das transmissões televisivas. 
O mercado do futebol se tornou restrito, apesar da criação das Divisoes do Campeonato - Brasileiro Séries A, B, C, D; Copa do Brasil; Sul-Americana e Libertadores.
No entanto, os aspectos positivos foram sobrepostos pelos negativos, com a desigualdade gritante entre o Clube dos 13 e os demais; o abismo de salários entre os jogadores. 

UM CLUBE PARADIGMÁTICO 
Fazendo o paralelo com o Clube Vila Nova das décadas de 1970 a 1980 com o de hoje: no passado, foi possivel formar equipes com estrelas da primeira grandeza do esporte nacional, tanto no futebol - jornada do Tetra, como no basquetebol, com astros globais da cesta que deram ao Vila os títulos de Campeão Brasileiro e Sul-Americano e 3º lugal no Campeonato Mundial de Basquete, entre 1973 e 1974. 
Hoje, é absolutamente impossível repetir tais feitos. 
O nome de Fernandinho está associado a um Clube Esportivo paradigmático; um modelo que deve ser lembrado, comparado e repetido, a partir do seu exemplo, personalidade, caráter e talento.


HUGO FERNANDO BONFIM QUEIROZ "FERNANDINHO" 
Por tudo o que foi exposto, devemos honrar, reconhecer, preservar e transmitir o legado de Fernandinho, jogador fora de série, homem e cidadão exemplar. 
O seu carisma, simpatia e empatia, seus dribles, arrancadas, passes e gols alegraram o futebol. 
Fernandinho permanecerá para sempre no coração e na memória dos brasileiros! Que sua alma descance em paz!

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