A bandeira é tão
inusitada que tão logo correu o mundo as imagens dos cartazes dos manifestantes
dando conta que um dos estopins dos protestos verde-amarelos era o “fora Copa”,
imediatamente, a Inglaterra, liderada por Londres, se apresentou à Fifa como
sede substituta, caso o Brasil desista da competição.
A questão requer
reflexão. Seria a proposta “fora Copa” coerente? O bom-senso indica que não, pois
a Inglaterra enfrenta situações econômicas iguais ou piores que o Brasil. O
nosso País tem um PIB superior àquele, possui melhores indicadores de geração
de emprego e renda, dentre outros. Ora, o que credencia a Inglaterra a sediar
um evento e não o nosso País? As manifestações de rua deixaram uma resposta
muito clarividente a esta pergunta: a infraestrutura pública, que extrapola aos
requeridos para a prática específica do evento de futebol e que inferioriza o
nosso País em relação aos do primeiro mundo.
Apaixonado pelo
futebol, o brasileiro também sempre foi apaixonado por política. Assim como o
escritor subscrito, muitos são os que integraram a geração de reconstrução da
UNE, dos Centros Acadêmicos, dos DCEs das Universidades, da CUT, da luta contra
a ditadura, das diretas já, da derrota do candidato das Forças Armadas no
Colégio Eleitoral, da Constituinte em 1988, da luta pelo impedimento do
presidente Collor, das campanhas e das eleições do primeiro metalúrgico e depois
da primeira mulher à presidência da República. Há, infelizmente, os
companheiros que perderam suas vidas na Guerrilha do Araguaia ou nos
enfrentamentos urbanos contra a repressão. Muitos outros, das gerações da década
de 1940 a 1970, que participaram da vitoriosa campanha o “Petróleo é nosso”,
das “reformas de base de Jango”, dos Centros Populares de Cultura, das
gigantescas passeatas de 1968 contra os Atos Inconstitucionais, da reconstrução
dos partidos de esquerda.
Não há divergência
entre todas essas gerações. Elas buscam a mudança do País. Todas concordam
inteiramente com a formulação da juventude atual, nas ruas, contra a corrupção
e o esbanjamento de dinheiro público nas obras da Copa do Mundo.
Ocorre que toda
proposta política tem que zelar pela sua coerência. As obras do evento futebolístico
estão praticamente prontas. Caso a insegurança pública permaneça no Brasil,
realmente a FIFA poderá transferir a Copa para outro país. Caso tal situação
tenha sido planejada com o propósito exclusivamente político, de desmoralização
do governo Dilma, bingo, ela é perfeita! Será um golpe mortal, abrindo caminho
para a vitória de qualquer candidato da oposição. Mas aí, o movimento também
será mortalmente desmoralizado, pois sua bandeira é: “sem partido”.
Assim, falta coerência
à proposta “fora Copa”. Na verdade, a juventude quer melhorar a eficiência,
eficácia e aplicação justa de recursos necessários à infraestrutura do Brasil para
sediar o evento. O que se pretende são investimentos que deixem um legado de ganhos
permanentes, que serão integrados à vida cotidiana dos brasileiros, não só
durante, mas após o evento.
Não se trata só – o que
já seria muito bom – construir Arenas Multiuso, destinadas ao futebol, aos
esportes olímpicos, a shows culturais e artísticos. Mas também, de
investimentos no transporte público com VLTs, BRTs, metrôs; implantação de
serviços de transporte, saúde e educação de melhor qualidade.
Para isso tudo,
entrementes, é preciso dinheiro, muito dinheiro. Aí está o porquê qualquer cidade
civilizada do primeiro mundo reivindicar a Copa. Trata-se da famosa parceria
público-privada, numa política chamada de “ganha-ganha”, na qual, tanto a
comunidade como os investidores privados lucram com o evento.
Como fazer isso? Seria
possível? A simplicidade é apenas aparente, pois se trata da mais fina flor da
moderna gestão pública. Requer-se a formulação de um marco regulatório dos
investimentos e dos retornos auferidos pela Copa, de maneira a reverter
recursos para investimentos em Serviços Públicos de Transporte, Saúde e
Educação!
A sugestão que se
apresenta nestas breves linhas é de formulação de uma Medida Provisória – MP,
por iniciativa da Presidência da República, em regime de urgência, a ser
enviada ao Congresso Nacional, que regulamente os artigos 220 a 224 da
Constituição Federal, referentes à Comunicação Social no Brasil. Propõe-se que
todas as emissoras de rádio e TV, que são concessões estatais, destinem os recursos das publicidades
veiculadas e referentes a megaeventos públicos no País para um fundo a ser
criado e regulamentado pela referida MP, com o objetivo de investimento em
transporte, saúde e educação públicos.
Por
exemplo, para a Copa 2014 ou as Olimpíadas 2016, os horários dos intervalos dos
jogos das seleções brasileiras sejam de futebol, de vôlei ou de basquete ou
toda mídia que tenha algum jogador ou atleta de uma equipe ou seleção nacional,
cujos valores correspondentes serão destinados integralmente ao “Fundo Nacional
de Investimentos Públicos em Transporte, Saúde e Educação do País”. Tal fundo
seria gerido pelo órgão competente da União, com a participação de entidades como
OAB, CNI, MPF, TCU, CBF. As prestações de contas serão divulgadas amplamente na
Internet, abrindo uma página virtual, inclusive, de acompanhamento das obras,
discussão de prioridades dos investimentos a serem realizados.
Creio
que esta sugestão terá todo apoio das Redes Sociais, do Movimento Passe Livre,
do Movimento de Combate à Corrupção, do MPF, do STF, das centenas de milhares
de pessoas que foram às ruas dia 20.06.13 em mais de trezentas cidades e até da
FIFA, da Rede Globo, da Veja, da Folha, do Estadão, pois todos estão
publicamente compromissados com as bandeiras levantadas por centenas de
milhares de brasileiros nas últimas manifestações realizadas Brasil afora.
Além
disso, desenvolve-se frente aos investidores estrangeiros uma garantia aos
eventos já agendados há tanto tempo no Brasil, mas que, de forma inesperada,
foram colocados em cheque, comprometendo investimentos de bilhões de dólares,
recursos estes de difícil captação, maturação e retorno. Ninguém é louco a
ponto de queimar dinheiro.
Ocorre
que os elevados investimentos, da forma como foram planejados até agora, geram
lucros e enriquecem ou mantem ainda mais ricos apenas uma minoria, desconsiderando
os interesses públicos nacionais. Bilhões de dólares serão embolsados,
exclusivamente, por alguns monopólios privados, à custa de muito investimento
público. O pobre está financiando uma oligarquia nacional e internacional,
inclusive, envolvida em escândalos ligados à máfia do futebol.
A
sugestão que se apresenta é uma forma de retornar ao povo o que ele está
desembolsando. A falta desse retorno, e não propriamente a Copa, gerou o
protesto e a formulação da bandeira aqui discutida que, deste ponto de vista, é
justíssima!
A regulamentação ora
formulada representa para o Brasil uma saída honrosa à ameaça de transferência
da Copa. E também, a possibilidade de retomar o ambiente de segurança, com a demonstração
ao mundo de brasilidade, de um povo civilizado, cumpridor dos compromissos internacionais
assumidos, que sabe protestar e formular estratégias de gestão pública
sustentável!
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